Como superar traumas
Uma das saídas é atribuir um novo significado aos eventos vividos no passado.
Incêndio, rompimento de barragem, chuva, acidentes… Na mente de algumas pessoas, a pergunta é: "o que mais falta acontecer neste ano"? Tragédias como a que ocorreu em Brumadinho dificilmente sairão da memória das pessoas. Especialmente daqueles que moravam na cidade. O desenvolvimento de traumas na mente de quem vive situações assim não nos surpreende.
Abuso sexual, bullying, assédio moral, violência obstétrica, acidente de carro, um relacionamento amoroso malsucedido ou, até mesmo, “tomar um caldo” na água do mar são situações que acontecem todos os dias e também podem produzir traumas. Todos estamos sujeitos à formação de traumas.
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Todos os dias atendo pessoas que vivem dificuldades emocionais em função da história de vida que tiveram. Também costumo ouvir histórias de traumas daqueles com quem convivo no dia a dia. Situações que podem ser traumáticas para algumas pessoas podem não ter esse mesmo efeito para outras. Somos diferentes e percebemos o mundo de forma diferente. Consequentemente, o mundo nos afeta de forma muito particular e, ainda que vivamos o mesmo evento, ele não será capaz de nos afetar da mesma maneira.
É possível, até mesmo, sofrermos um trauma de um evento que sequer ocorreu conosco diretamente. Há alguns anos, atendi um rapaz que estava vivendo uma grande perturbação emocional devido a algo que havia acontecido com sua namorada. Ela havia sido estuprada por um bandido durante um assalto em sua casa. O namorado não estava lá, não viu o que ocorreu, apenas tomou conhecimento posteriormente, mas sofreu o trauma e passou a manifestar algumas dificuldades emocionais que trabalhamos em terapia para que ele superasse e pudesse voltar a viver normalmente.
Quando a saúde emocional não vai bem, nosso sistema imunológico é afetado diminuindo nossa resistência a doenças autoimunes e infecções em geral. Se nossas demandas emocionais não recebem a devida atenção após um evento traumático, podemos desenvolver sintomas relacionados a estresse, depressão e ansiedade. Já as crianças podem experimentar algum tipo de regressão.
Como ajudar alguém que sofre de um trauma?
Como escrevi anteriormente, situações que podem ser traumáticas para algumas pessoas podem não ter esse mesmo efeito para outras. Por isso, devemos ser cuidadosos ao emitirmos nossos julgamentos sobre o sofrimento do outro. Coisas que são "bobeiras" para você podem mexer profundamente com quem está ao seu lado. E aquelas que mexem com você, certamente não mexem de igual forma com todos.
Ao entrarmos em contato com alguém que sofre os efeitos negativos de uma determinada experiência, devemos legitimar sua dor. O exercício da empatia é uma das melhores coisas que podemos fazer nessas ocasiões. Esse é o momento de abrir mão da opinião pessoal e conectar-se ao outro a partir de sua perspectiva para conseguir compreender melhor o significado que a experiência vivida tem para ele.
É preciso, também, agir com paciência. Cada um possui um tempo de reação. Você pode ser tentado a rotular a pessoa de teimosa ou difícil, mas isso não ajudará em nada. Pelo contrário. Além disso, sempre que possível, tente auxiliar a pessoa a buscar ajuda profissional. O psicólogo foi treinado para lidar com esses casos e poderá oferecer um suporte especializado.
Como lidar com meus traumas?
Se em sua vida você já desenvolveu traumas que permanecem até hoje, o caminho da superação se chama ressignificação. Você não pode voltar no tempo e modificar os fatos como eles ocorreram, mas pode modificar os fatos na forma como você os percebe e como eles lhe afetam.
Ressignificar é atribuir um novo significado a algo. Fazemos isso constantemente com diversas coisas ao nosso redor. Mas fazemos não intencionalmente e, portanto, não percebemos. Todavia, podemos fazer intencionalmente e com isso mudar a forma como os eventos do passado nos afetam.
É possível ressignificar eventos da vida por conta própria, mas em casos de traumas, indico sempre o suporte de um profissional, uma vez que a dor emocional sentida é, em grande parte, um fator que dificulta a realização desse processo sozinho.
Prevenção
Ainda que seja impossível impedir que eventos ruins aconteçam, podemos ter uma atitude preventiva em relação à formação de traumas. Enquanto estamos em tempos de paz, ou seja, enquanto não há uma dor emocional, podemos trabalhar pelo desenvolvimento de habilidades para sermos resilientes.
Infelizmente a maior parte das pessoas não costumam agir de forma preventiva, mas essa é sempre a melhor opção. Se você desenvolve resiliência em tempos de paz, quando vêm os tempos de crise, você tem mais estrutura emocional para lidar com os problemas e sua resposta emocional é mais adequada.
Fé para todo tempo
O exercício da fé é um recurso eficaz para a superação de situações difíceis, sendo tanto uma medida preventiva contra a formação de traumas quanto uma ferramenta de enfrentamento.
Ao escrever essas palavras, veio à minha mente o texto bíblico de 2 Coríntios 11:24-28. Ali o apóstolo Paulo cita uma série de eventos que viveu em seu ministério. Açoites, naufrágio, prisões… No capítulo seguinte, comenta ainda algumas situações difíceis experimentadas, e nos versos 9 e 10 vemos a descrição desses eventos ressignificados:
“E disse-me: A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo. Por isso sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias por amor de Cristo. Porque quando estou fraco então sou forte” (2 Coríntios 12:9,10).
Quanta resiliência! Que inteligência emocional! Transformar experiências dolorosas em motivo de prazer é atribuir um novo significado àquilo que poderia produzir traumas. Foi o exercício da fé que permitiu a Paulo produzir esse novo significado. O exercício da fé também pode mudar a sua forma de se relacionar com os eventos de sua vida!