Convenção em Ijuí discute como formar discípulos e igrejas com raízes profundas
Evento também uso dos dons para envolvimento dos fiéis.
Ijuí, RS... [ASN] Imagine a seguinte situação: um casal que tem uma vida estável em uma cidade com cerca de 83 mil pessoas resolve se mudar para um município bem menor, com apenas 6 mil e 500 habitantes. Para que isso ocorra, a esposa resolve se inscrever em um concurso público para trabalhar na área de saúde bucal – na qual já tem formação técnica – convicta de que aquele era o lugar para onde ela, o marido e a filha de onze anos deviam ir. O esposo precisa se adaptar a situação e buscar uma alternativa de sustento para ajudar nas finanças – neste caso, um estabelecimento comercial foi a escolha. Tudo isto, motivado, em essência, por um objetivo singelo: contribuir com o processo de plantação de uma Igreja Adventista na cidade.
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A história e os protagonistas são reais. Os gaúchos Márcia e Esnar Gonçalves moravam em Ijuí. A esposa atuava como recepcionista e vendedora em uma indústria que produz farinha de trigo. Já o marido exercia a função de entregador contratado por uma empresa de balas. Por ser formada na área de saúde, o sonho de trabalhar na área é antigo - daí, a busca específica por concursos públicos no Estado. Enquanto pesquisava, se deparou com o município de Aratiba, próximo a Erechim, na divisa com o Estado de Santa Catarina. “Confesso que eu me assustei com a distância no começo, mas eu tinha na mente que eu devia ir para Aratiba. Na véspera do concurso, pesquisando, eu descobri que lá não tinha presença de adventistas e o Esnar me falou que "se acontecesse de a gente se mudar para lá, teríamos que criar um grupo de estudos da Bíblia”, conta Márcia.
No entanto, Aratiba não havia sido a única cidade pela qual Márcia havia prestado avaliações. Santa Cruz do Sul e Tapejara estavam na lista, sendo que o último deles já tinha antecipado uma possível confirmação de chamado. “Estava quase tudo certo para trabalhar em Tapejara, mas para a minha surpresa, Aratiba me chamou primeiro”, relembra a profissional de saúde, que hoje atende em um consultório de odontologia como auxiliar. Já na cidade, o marido encontrou um local para abrir uma padaria, onde atua até hoje. Por ser um seguidor dos princípios bíblicos, faz questão de não abrir o estabelecimento aos sábados. “O dia que ela mais vende é justamente o dia em que está fechada. Muitos tem coragem de perguntar [o porquê], outros não... É um testemunho, muitas vezes, silencioso”, define Esnar.
Orações respondidas
Após algumas semanas e já inseridos na realidade local de Aratiba, os dois passaram a estabelecer amizades e acabaram descobrindo que outro casal, morador do município, pertencia a Igreja Adventista “Conhecemos a Adriana e o Rogério e soubemos que eles já oravam para que pessoas com a mesma crença que eles viessem para cá”, revela Esnar. A farmacêutica e bioquímica Adriana Trentin conta que o motivo das orações era porque precisavam de apoio espiritual, já que haviam conhecido a igreja em tempos recentes e não tinham outros amigos adventistas na cidade. Para terem um vínculo com a rotina da igreja, eles precisavam ir até um dos templos de Erechim, que fica a 34 km de onde moram. “Melhorou muito, porque a gente começou a trocar experiências de coisas que passávamos, começamos um grupo de estudos e, graças a Deus, abrimos um Espaço Novo Tempo aqui na cidade”, conta.
Exceto pelas orações respondidas, a história de Márcia e Esnar aborda, pelo menos, dois aspectos enfatizados durante a Convenção Missionária que a Igreja Adventista realizou em Ijuí, voltado a líderes de diversas áreas: a disposição para servir a Deus em qualquer lugar, inclusive em cidades onde ainda não há presença de adventistas registrada e, o uso dos dons e habilidades – entre eles, àqueles vinculados às profissões – com objetivo de influenciar pessoas no sentido bíblico.
Meu talento, meu ministério
Um dos convidados da convenção, o líder da área de Missão Urbana da Igreja Adventista para região leste do Estado de São Paulo, pastor Jair Miranda, entende que as habilidades concedidas por Deus para exercício do trabalho são fundamentais para a difusão do evangelho. "Deus não te deu uma profissão apenas para usufruir do dinheiro. Ele te deu para que você tenha a oportunidade de entrar em contato com várias subculturas e alcançá-las", defende.
Durante o evento, o palestrante internacional Johnny Wong, que costuma abordar temas voltados ao plantio de igrejas, também abordou questões em torno do papel missionário dos cristãos, especialmente no que diz respeito ao contato e acompanhamento de novos fiéis. Wong é um ex-executivo da empresa multinacional Oracle, do ramo da tecnologia e da informática. Seu setor estava especialmente ligado a softwares para companhias de transporte aéreo. Pouco antes de ocorrer o episódio do 11 de setembro, ele estava se sentindo infeliz com o que fazia, mesmo viajando pelo mundo todo e ganhando uma grande quantia em dinheiro. Em sua mente, entendia que devia fazer algo para ajudar jovens a terem suas vidas transformadas.
Com isto, ele pediu demissão de seu trabalho e, com a tragédia das torres gêmeas, o setor onde atuava enfrentou uma crise gravíssima (isto, quando já havia saído de seu emprego) para se dedicar a missão. Há alguns anos, se tornou um especialista no que diz respeito a como formar discípulos. Sua fala foi traduzida e interpretada pelo pastor Milton Torres, coordenador do curso de Tradutor e Intérprete do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp - campus Engenheiro Coelho).
Bebês espirituais
Para Wong, existe um paradigma a ser quebrado quando se trata da conquista de novos fiéis a partir da pregação da palavra de Deus, em especial ao que diz respeito ao público jovem. Ele acredita que o formato em o simpatizante recebe uma série de estudos bíblicos, aceita o batismo e passa a cumprir pequenas tarefas dentro do contexto da igreja, semana após semana, não é suficiente para mantê-lo firme. “Por que muitos jovens acabam saindo da igreja após um período? Porque, de maneira geral, não temos dedicado tanto tempo ensinando-os a como andar com Jesus, a se relacionar com os outros, a acompanhá-los, a demonstrar a Palavra. No começo, eles são apenas bebês espirituais e precisam de alimento e de modelos que deem suporte à eles, até que realmente se tornem discípulos. Um claro exemplo disto é o que Jesus fazia com Pedro, Tiago e João: ele andava, viajava, ensinava e era o professor deles e tinha muito tempo com eles. Não se trata apenas de passar informações. Nós precisamos mudar o paradigma”, aconselha Wong.
Acolhimento e paciência
Um exemplo recente de uma iniciativa que contempla as recomendações de Wong na região noroeste do Rio Grande do Sul foi a formação do Espaço Novo Tempo de São Miguel das Missões. O trabalho pioneiro no município começou por meio da família Halles, que saiu em busca de interessados por estudos bíblicos. Na ocasião, conheceram a família de Clarise, que passava por problemas emocionais e precisava de apoio e atenção. Para tentar ajudar a nova amiga, a mãe da família, Seila Halles, comunicou o pastor Diego dos Santos, que era o responsável por igrejas em Santo Ângelo e cidades vizinhas na época. O pedido fez com que o líder criasse um pequeno grupo para estar em contato ela, ao mesmo tempo em que gerava interesse de outras pessoas necessitadas de conforto espiritual.
Aos poucos, um número expressivo de pessoas começou a se interessar pela igreja por meio destas pessoas e a sala onde as reuniões eram feitas se tornou insuficiente. Foi então que o grupo começou a fazer os estudos em uma espécie de garagem. Os novos interessados eram logo envolvidas ações evangelísticas para fortalecer a presença adventista na localidade e, junto a isto, o clima de amizade construído, fizeram com que a garagem também se tornasse um local pequeno para as reuniões. Foi então que uma das participantes, chamada Alice, cedeu um espaço para que os encontros ocorressem e que, agora, foi consolidado como o local oficial da nova igreja.
“Desde o começo, nós temos o compromisso de estar com os amigos, chamá-los de nossos irmãos, sem a pressão de que eles sejam batizados. Isto até acontece, mas em decorrer do tempo e da decisão delas”, conta Seila, que foi quem abriu a casa para as reuniões do pequeno grupo. Na opinião dela, ainda há um benefício pessoal que considera importante no trabalho realizado. “A gente se envolve na pregação do evangelho, a gente cresce espiritualmente e isso faz a família toda da gente se envolver. Um dos meus filhos ajuda na recepção, outro ajuda na parte de sonoplastia, então é muito bom”, conclui.
Andreia Barrichello foi uma das primeiras pessoas convidadas para assistir as reuniões do grupo de estudos. Ela conta que o clima de acolhimento, amizade e paciência foi determinante para que permanecesse e fosse contagiada ao ponto de convidar outras pessoas para participar. Hoje, ela é uma das pessoas que aceitou o batismo e segue ativa com o restante do grupo. “Eles foram muito acolhedores e nós convidamos outras pessoas com o mesmo carinho. Existem muitas coisas no mundo que afastam as pessoas de umas das outras e, de Deus, mas graças a Deus, lá não é assim. Temos muito amor pelos outros. Quando um cai, o outro levanta. Um grupo de pessoas, amigas, em que um quer o bem do outro, um auxilia o outro em tudo. Em primeiro lugar, o suporte é Deus, e em segundo lugar, essa amizade – não para querer mais membros, mas para querer mais irmãos conosco”, caracteriza.
A convenção também foi palco para lançamento do filme o Resgate, que será exibido no período da Semana Santa 2017 e do projeto Domingos Especiais. [Equipe ASN, Willian Vieira]