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Coluna | Ana Paula Ramos

Cristão (não) tira férias e feriado

Todo e qualquer momento pode ser uma oportunidade para tocar a vida de alguém.


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Vista do Oásis de Siwa do alto do Monte dos Mortos (Foto: Arquivo pessoal)

Estamos completando quase dois anos desde que voltarmos para o Egito, depois de já termos morado aqui durante outros 18 meses. Há algumas semanas, tivemos a oportunidade de conhecer um dos lugares mais belos e exóticos do país durante um feriado prolongado: o Oásis de Siwa, o mais distante do Cairo em direção ao imenso deserto do Saara.

A ideia inicial era irmos de carro, em uma jornada de 12 horas deserto a dentro. Mas pesquisando um pouco mais sobre o lugar, a aventura com nossa pequena de três anos pareceu melhor se feita com um grupo de turistas locais (nos demos conta disso três dias antes da viagem!). Vários pacotes estavam disponíveis online e encontramos um muito bom, mas o anúncio dizia que as reservas tinham encerrado há 10 dias. Resolvi ligar e deu certo.

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Em cinco anos de operação, a pequena agência de turismo local fechou um pacote para seus primeiros turistas estrangeiros. Fomos eu, meu esposo, a Duda e duas amigas argentinas entre outros 13 egípcios. Éramos os únicos cristãos no micro-ônibus.

Eu estava muito ansiosa para saber como seriam esses cinco dias entre eles. Poucos minutos depois nos acomodarmos em nossos assentos, outro casal chegou, acompanhado por um menino de dois anos. Meus olhos brilharam. Que surpresa boa! Eu imaginava que nós seriamos os únicos a levar uma criança de três anos para esse destino rústico. 

Teste desafiador

Naquele momento, agradeci a Deus e dali pra frente recebemos muitas confirmações de que a viagem, da forma como aconteceu, estava nos planos dEle muito antes de estar nos nossos. O roteiro foi preparado com vários momentos para sentarmos juntos pra conversar, trocar ideias, nos conhecermos melhor e visitar lugares incríveis.

Em Siwa, fomos surpreendidos com a beleza dos lagos de sal (Foto: Arquivo pessoal)

Como um povo muito alegre, a música egípcia estava sempre tocando ao longo dos trajetos. Mas no sábado ninguém pediu pra ligar o rádio ou usou o celular com música alta pra todo mundo ouvir. No final do dia, nos emocionamos ao lembrar disso enquanto cantávamos louvores à beira da praia durante nosso culto de pôr do sol.

A Duda e seu pequeno amiguinho se divertiram bastante - e também brigaram um monte quando o assunto era dividir os brinquedos. Em um desses momentos, ele mordeu o rosto da nossa pequena com força. As marcas dos dentes ficaram, e o rosto permaneceu inchado e roxeado por vários dias. Num segundo de distração dos pais, o menino reagiu dessa forma quando a Duda puxou o carrinho que ele não queria emprestar. Não sei que reação os pais esperavam de mim ao correr para acudir minha filha aos berros.

Esperei ela se acalmar, pedi pra que me contasse o que aconteceu e ela mesmo explicou que foi porque puxou o carrinho das mãos do garoto. Os pais, desconsolados, pediam mil desculpas e o pequenino também veio desculpar-se logo em seguida, assim que o susto passou e ele conseguiu entender melhor a situação. Tudo voltou ao normal. Aceitamos o pedido de desculpas, claro, e a Duda também reconheceu que estava errada. Eu disse à mãe aflita que estava tudo bem.

Bate-papo e momento de apresentação pessoal com a turma da viagem em Siwa (Foto: Arquivo pessoal)

Reação a reações 

O episódio aconteceu no meio do passeio. As crianças ainda brincaram muito e a viagem seguiu tranquila e maravilhosa. Combinamos de marcar novos encontros quando retornássemos ao Cairo, mas minha maior surpresa foi a mensagem que recebi dessa jovem mãe três dias depois de voltarmos pra casa:

“Ana, eu só gostaria de dizer como você e o Marcos nos tocaram. Essa viagem não poderia ter sido assim (tão boa) sem vocês. Nós tivemos a chance de ver um pouco mais do Egito através dos olhos de vocês. Eu acho que nunca mais viveremos da mesma forma por aqui. Agradeço muito por nos motivar mais a usar a palavra “está tudo bem”. Nós estamos acostumados a viver uma vida muito dura e vivemos mentalmente exaustos da forma como a vida segue aqui com nossas famílias. Estamos tentando mudar como reagimos a essa realidade e vocês nos ajudaram muito, realmente. Muito obrigada! Eu geralmente fico muito nervosa quando o meu filho fica agitado, mas agora eu tenho aprendido a também dizer e sentir que está tudo bem.”

Em lágrimas, agradeci a Deus mais uma vez por conseguir enxergar a mudança diária que Ele tem feito em meu coração de pedra para servi-Lo, pelo privilégio de vivenciar experiências humanas com os olhos dEle. São confirmações de nossa caminhada tortuosa, mas na direção certa: rumo ao Céu. Meu desejo é que você e eu possamos viver de tal forma que nossos mais simples gestos testemunhem do amor de Deus onde estivermos, aonde formos. Esse amor transforma vidas.

Ana Paula Ramos

Ana Paula Ramos

Missão e Voluntariado

Até onde vão pessoas que se colocam nas mãos de Deus para servir na missão de pregar o evangelho.

Jornalista e escritora, foi voluntária no Egito entre 2014 e 2015, onde mora atualmente com seu esposo, Marcos Eduardo (Zulu), e suas filhas, Maria Eduarda e Anna Esther. É autora do livro Desafio nas Águas: Um resgate da história das lanchas médico-missionárias da Amazônia (CPB).