A escada do progresso cristão
O roteiro de Deus para o crescimento na vida cristã e no caráter
O objetivo deste artigo é apresentar “o plano divino para desenvolvimento do caráter cristão”.[1] O início da vida cristã é marcado pelo arrependimento, aceitação de Jesus Cristo como Senhor e Salvador, perdão e novo nascimento pela água e Espírito Santo (Atos 2:36-38; João 3:3-5). Os que de fato nasceram de novo “foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se tornaram participantes do Espírito Santo” (Hebreus 6:4, 5).[2] Mas, o que vem depois? “Ora, como recebestes Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele” (Colossenses 2:6).
Após o batismo do Espírito, “a todos nós foi dado beber de um só Espírito” (1 Coríntios 12:13). Pelo Espírito Santo, o caráter é transformado continuamente à semelhança de Jesus e produz frutos (2 Coríntios 3:18; Gálatas 2:20; 5:16-25). “A transformação começa no novo nascimento e continua até o aparecimento de Cristo” (1 João 3:2).[3] É um processo denominado “santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hebreus 12:14).
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Mas, para crescer na graça, devemos desejar “ardentemente, como crianças recém-nascidas, o genuíno leite espiritual, para que, por ele”, nos “seja dado crescimento para salvação” (1 Pedro 2:2). A Bíblia é este alimento espiritual genuíno. Ela torna o crente “sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus”. A Palavra de Deus repreende, corrige, educa e transforma (2 Timóteo 3:15-17). As Escrituras também fornecem “alimento sólido” ao diligente estudioso, tornando-o “adulto” e possivelmente, “mestre” na fé (Hebreus 5:12-14).
O poder advindo da graça
A segunda carta de Pedro é uma poderosa prova do crescimento na graça. Foi escrita pelo discípulo cujo caráter impulsivo e autoconfiante fora totalmente transformado à semelhança de Cristo. Seus leitores aceitaram a Jesus como Deus, Salvador pessoal, e confiavam em Sua imaculada justiça. “Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que conosco obtiveram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo” (2 Pedro 1:1).
Contudo, o experiente e idoso pescador desafiou-os a prosseguir e alcançar um crescimento multiplicado. “Graça e paz vos sejam multiplicadas, no pleno conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor” (verso 2). Nesta carta, Pedro também mostrou “o que o poder de Seu Senhor é capaz de fazer por nós”.[4] Lembrou que o Senhor deu "suas preciosas e mui grandes promessas, para que por elas” nos tornemos “coparticipantes da natureza divina”, livrando-nos “da corrupção das paixões que há no mundo" (2 Pedro 1:4).
As “preciosas e mui grandes promessas” de Cristo estão na Santa Bíblia. De fato, as Escrituras não são “fábulas engenhosamente inventadas”, produto de “particular elucidação” ou “vontade humana”, pois “homens santos falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo” (2 Pedro 1:16-21; 2 Timóteo 3:16). Sem o Espírito e a oração não podemos compreender as Escrituras. Porém, “sempre que estudamos a Bíblia com um coração suplicante, o Espírito Santo está perto para nos abrir o sentido das palavras que lemos”.[5] E “todo aquele que procura sinceramente alcançar a vitória sobre o próprio eu se apropriará da promessa: "A Minha graça te basta" (2 Coríntios 12:9)”.[6]
O crescimento em Cristo
Pedro recomendou um plano de crescimento contínuo: “Por isso mesmo, vós, reunindo toda a vossa diligência, associai com a vossa fé a virtude; com a virtude, o conhecimento; com o conhecimento, o domínio próprio; com o domínio próprio, a perseverança; com a perseverança, a piedade; com a piedade, a fraternidade; com a fraternidade, o amor” (2 Pedro 1:5-7). Este plano é divinamente reconhecido como “a escada do progresso cristão”. “O apóstolo apresenta aos crentes a escada do progresso cristão, cujos degraus representam cada qual um acréscimo no conhecimento de Deus e em cuja ascensão não deve haver parada. Fé, virtude, ciência, temperança, paciência, piedade, amor fraternal e caridade são os degraus da escada”.[7] O ensino do apóstolo não é legalista, e jamais devemos imitar os que “buscam galgar a escada do progresso cristão, mas ao avançarem, começam a pôr a confiança na capacidade humana, e logo perdem de vista a Jesus”.[8]
Note que a escada inicia com a fé em Cristo, e termina com o amor a Cristo. Só podemos subir pela fé “que atua por amor” (Gálatas 5:6), “um subir pelos méritos de Cristo”.[9] Ele é a escada (Gênesis 28:12, 13; João 1:51). “Indicai aos jovens a escada de oito degraus de Pedro, e ponde-lhes os pés, não no último degrau, mas no primeiro, e com fervor pedi-lhes que subam até o último. Cristo, que une a Terra e o Céu, é a escada”.[10] E “vocês não devem pensar que precisam esperar até haver aperfeiçoado uma graça para depois cultivar outra. Não; elas devem crescer juntas, alimentadas pela fonte do amor”.[11]
(1) “associai com a vossa fé a virtude” (2 Pedro 1:5). O termo arete traduzido por virtude significa “bondade” e “excelência”.[12] “O pensamento de Pedro pode ser assim parafraseado: “em conexão com a vossa fé, acrescentai excelência moral”.[13] A transformação do caráter de Pedro foi obra do Espírito Santo (Mateus 26:75; João 14:16, 17; 21:15-19). “Pelo poder do Espírito Santo deve a imagem moral de Deus ser aperfeiçoada no caráter”.[14] A propósito, “não há um impulso de nossa natureza, nem uma faculdade do espírito ou inclinação do coração, que não necessite ser direcionado a todo instante pelo Espírito de Deus”.[15]
(2) “com a virtude o conhecimento” (verso 5). Pelo conhecimento de Deus e de Jesus, foi-nos dado “tudo o que diz respeito à vida e piedade” (2 Pedro 1:13)”.[16] Este conhecimento vem pela comunhão: estudo da Bíblia, oração, e resulta em obediência de amor à Palavra, e a santa Lei de Deus (João 8:32; 14:6; 17:3, 17; 1 João 2:4). Envolve “o conhecimento da verdade como é em Jesus, conhecimento do grande plano da salvação”.[17] Pelo conhecimento e apego à verdade em Cristo, não seremos mais “como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina”, pois, “seguindo a verdade em amor”, cresceremos “em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Efésios 4:14,15).
(3) “com o conhecimento, o domínio próprio” (2 Pedro 1:6).[18] Domínio próprio, do grego egkrateia, significa autocontrole, ou temperança. Uma pessoa temperante “em tudo se domina” (1Coríntios 10:25). Isso inclui “qualquer coisa” ou “tudo” que fizermos. “Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para glória de Deus” (2 Coríntios 10:31). Os antediluvianos “comiam, bebiam, e davam-se em casamento”, mas para sua própria destruição (Mateus 24:38, 39). “O mesmo aconteceu nos dias de Ló” e: “Assim será no dia em que o Filho do Homem se manifestar” (Lucas 17:28-30).
“A intemperança jaz à base da depravação moral do mundo”.[19] Por isso: “A verdadeira temperança requer total abstinência de bebida forte. Pede também reforma nos hábitos dietéticos, no vestir, no dormir”.[20] Logo: “Um homem intemperante, que usa estimulantes - cerveja, vinho, bebidas fortes, chá (estimulante) e café, ópio, fumo e qualquer dessas substâncias deletérias à saúde - não pode ser homem paciente. Assim, a temperança é um degrau da escada em que devemos pôr os pés antes de acrescentar a graça da paciência”.[21]
(4) “com o domínio próprio, a perseverança” (verso 6). O fiel remanescente bíblico dos últimos dias é conhecido por sua perseverança e paciência (Apocalipse 14:12). “Os que, depois de reconhecerem seus erros, tiverem coragem para reformar seus hábitos, hão de experimentar que o processo de reforma exige lutas e muita perseverança”.[22] Mas a vitória virá pelo “contínuo auxílio de Jesus, resoluta decisão, inflexível propósito, constante vigilância e incessante oração”.[23] “Ninguém fará qualquer progresso para o alto sem perseverante esforço. Aquele que quiser vencer tem de apegar-se a Cristo”.[24]
(5) “com a perseverança, a piedade” (verso 6). A palavra grega traduzida por piedade é eusebeia (1Timóteo 2:2, 10; 3:16; 4:7, 8; 6:3). Implica em ser “bem reverente, devoto e piedoso”.[25] Ela “designa a atitude religiosa no sentido mais profundo, a verdadeira reverência a Deus que advém do conhecimento dEle”.[26] É abrangente, pois envolve “uma consciência muito prática de Deus em todos os aspectos da vida”.[27] Como resultado, esta qualidade “impede o cristão de se tornar farisaico, mantendo-o humilde, e gentil”.[28]
(6) “com a piedade, a fraternidade” (versos 7). “Amai a fraternidade” (1 Pedro 2:17, ARC). O termo grego é philadelphia. Significa “amor entre irmãos”.[29] Mas “a grande verdade da fraternidade humana” envolve toda humanidade, pois Deus “fez todos de um só” (Atos 17:26, 27).[30] “À vista de Deus todos são iguais”.[31] Nosso maior exemplo é Cristo. “Nenhuma questão política Lhe influenciava a maneira de agir. Não fazia diferença alguma entre vizinhos e estranhos, amigos e inimigos. O que tocava Seu coração era uma alma sedenta pelas águas da vida”.[32] “O Salvador misturava-Se com os homens como uma pessoa que lhes desejava o bem. Manifestava simpatia por eles, atendia-lhes às necessidades e conquistava-lhes a confiança. Ordenava então: "Segue-Me".[33]
(7) “com a fraternidade, o amor” (verso 7). O termo grego para caridade é ágape.“O maior destes é o amor” (1 Coríntios 13:13).“O crescimento espiritual começa com a fé, nossa primeira reação ao evangelho, e culmina com o amor, a maior de todas as virtudes.[34] O amor de Deus em nós resulta no “cumprimento da lei” (Romanos 13:10; 1João 5:3), e evidencia a perfeição cristã (Mateus 5:44-48).[35] O amor pratica “atos de beneficência”[36] (Atos 2:45, 46; 4:32, 36; 9:36; 20:33-35), ao ponto do “auto sacrifício pelo bem da pessoa amada”.[37]
A seguir o apóstolo declara duas poderosas convicções. (1) “Porque estas coisas, existindo em vós e em vós aumentando, fazem com que não sejais nem inativos, nem infrutuosos no pleno conhecimento de nosso Senhor Jesus” (2 Pedro 1:8). (2) “Pois aquele a quem estas coisas não estão presentes é cego” (verso 9). Em vez de presunçosamente afirmarmos que “nos sentimos salvos”, “com diligência cada vez maior”, confirmemos nossa “vocação e eleição” “pois desta maneira” nos “será amplamente suprida a entrada no reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (versos 10, 11). Lembremos das seguintes promessas:
“Não há possibilidade de fracasso para aquele que, avançando pela fé, ascende degrau a degrau, sempre para cima e para a frente, em direção ao último degrau da escada que alcança os próprios portais do Céu”.[38] “Se os homens lançarem mão da natureza divina, trabalhando num plano de adição, acrescentando graça a graça no aperfeiçoamento do caráter cristão, Deus agirá num plano de multiplicação.[39] Lembre-se, você é “responsável pela realização de um diário crescimento na graça”.[40] Assim, pela graça de Deus subamos degrau a degrau “olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus” (Hebreus 12:2).
[1]WHITE, Ellen G. Atos dos apóstolos, 9ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2013, p. 529. A seguir: Atos dos apóstolos.
[2]Salvo quando indicado, a versão usada neste artigo é a João Ferreira de Almeida Revista e Atualizada, 2ª ed. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.
[3]NICHOL, Francis D. ed. em inglês; DORNELES, Vanderlei, ed. em português. Comentário bíblico adventista do sétimo dia, 1ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2014, v. 7, p. 653. A seguir: Comentário bíblico adventista do sétimo dia.
[4]Ibidem, v. 7, p. 652.
[5]WHITE, Ellen G. “Search the Scripture”, Advent Review and Sabbath Herald, Battle Creek, MI, Review and Herald Publishing Association, 9 de outubro de 1883, p. 626.
[6]_______. “The transforming grace of God”, Advent Review and Sabbath Herald, Battle Creek, MI, Review and Herald Publishing Association, 10 de junho de 1884, p. 329.
[7]Atos dos apóstolos, p. 530.
[8]Ibidem, p. 532.
[9]WHITE, Ellen G. Cristo triunfante, MM 2002, Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, p. 87.
[10]_______. Conselhos sobre educação, 3ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, p. 147 [133]. A seguir: Conselhos sobre educação.
[11]“Comentários de Ellen G. White” em Comentário bíblico adventista do sétimo dia, v. 7, p. 1051.
[12]Ibidem,p. 652.
[13]Ibidem, p. 654.
[14]WHITE, Ellen G. E recebereis poder, MM 1999, p. 25.
[15]_______. Eventos finais, 1ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2012, p. 40.
[16]Atos dos apóstolos, p. 531.
[17]WHITE, Ellen G. Nossa alta vocação, MM 1962, p. 66. A seguir: Nossa alta vocação.
[18]Bíblia Almeida Revista e Corrigida, 12ª ed. Santo André, SP: Geográfica Editora, 2009. A seguir: ARC.
[19]WHITE, Ellen G. A ciência do bom viver, 10ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2013, p. 335.5. A seguir: A ciência do bom viver.
[20]_______. Temperança, 3ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2012, p. 196.
[21]Nossa alta vocação, p. 67.
[22]WHITE, Ellen G. Conselhos sobre regime alimentar, 12ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2012, p. 127.
[23]_______. Testemunhos seletos, 5ª ed. Santo André, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1985, v. 2, p. 114.
[24]Conselhos sobre educação, p. 147, 148 [133, 134].
[25]STRONG, James, ed. “Diccionário de las palabras griegas”, em Nueva concordância strong exhaustiva, Nashville: Grupo Nelson, 2003, item 2152, p. 37.
[26]KELLY, J. N. D. I e II timóteo e tito, 1ª ed. São Paulo: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1983, p. 65.
[27]GREEN, Michael. II pedro e judas, 1ª ed. São Paulo: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1983, p. 66.
[28]Comentário bíblico adventista do sétimo dia, v. 7, p. 654.
[29]Ibidem.
[30]Atos dos apóstolos, p. 238.
[31]Ibidem.
[32]A ciência do bom viver, p. 25.
[33]WHITE, Ellen G. Obreiros evangélicos, 5ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2011, p. 363.
[34]Bíblia de Estudo Andrews, Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2015, p. 1626. A seguir: Bíblia de Estudo Andrews.
[35]Ibidem, p. 1626.
[36]DAVIS, John. Dicionário da Bíblia, 9ª ed. Rio de Janeiro: Juerp, 1983, p. 106.
[37]Comentário bíblico adventista do sétimo dia, v. 7, p. 654.
[38]Atos dos apóstolos, p. 533.
[39]Conselhos sobre educação, p. 148 [134].
[40]WHITE, Ellen G. Conselhos sobre saúde, 4ª ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2013, p. 244.