Herdeiros do reino x herdeiros da Babilônia
A crença de Daniel em um Deus que se preocupa com as demandas individuais deu a ele a capacidade de se aproximar de Nabocodonosor
Nos textos anteriores você encontrará artigos de uma série com base em meu livro, Herdeiros do Reino, lançado pela Casa Publicadora Brasileira (CPB). Baseado no livro bíblico de Daniel, apresento lições que extraí dele para minha vida. Abaixo, compartilho com você uma versão resumida do quinto capítulo. Caso ainda não tenha lido os demais, acompanhe-os aqui.
“O livro de Daniel considera o céu e a terra como estando intimamente conectados, com uma distância entre os dois quase insignificante” (Zdravko Stefanovic).
Um dos textos mais extraordinários da Bíblia é o capítulo 2 do livro de Daniel. Ao longo das eras, milhares de pessoas se maravilharam com sua exatidão profética. Os acontecimentos descritos ali ocorreram três anos depois da chegada de Daniel e seus amigos à Babilônia. Era o segundo ano do reinado de Nabucodonosor (Daniel 2:1). Naquele período, aconteceu algo grandioso: o jovem teve a oportunidade de ir à presença do rei e falar com ele pessoalmente. Nabucodonosor era um estadista visionário e empreendedor.
Nós podemos apenas imaginar a grandiosidade da cidade, dos palácios e dos templos de Babilônia. Descobertas arqueológicas demonstram que a cidade possuía 43 centros de culto e 900 locais de adoração. Mas um dos edifícios mais magníficos de Babilônia era o palácio de Nabucodonosor.
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Imagine Daniel entrando nesse palácio para falar com o rei. Toda a pompa e beleza do ambiente não foram suficientes para intimidar esse servo de Deus. O contraste entre os dois homens era gigantesco, e isso fica claro na maneira como Daniel escreveu o capítulo 2 de seu livro. Muitas vezes olhamos para esse capítulo apenas para explicar a sucessão de reinos apresentada na estátua do sonho de Nabucodonosor, mas uma das lições mais profundas desse capítulo é a diferença entre as atitudes de Daniel e de Nabucodonosor.
O rei havia tido um sonho. A sociedade babilônica considerava os sonhos mensagens divinas e, às vezes, os compilavam em “livros de sonhos”. As pessoas costumavam passar a noite em um templo para receber essas mensagens. Por isso, o rei levou o sonho a sério e “se perturbou” por não ter a interpretação. Chamou os magos, encantadores, feiticeiros e sábios e disse-lhes: “Tive um sonho e fiquei perturbado, querendo saber que sonho foi esse” (Daniel 2:3). É provável que o rei tivesse esquecido o sonho. Não sei se isso já aconteceu com você. Comigo já aconteceu algumas vezes: eu sei que sonhei e fico tentando lembrar qual foi o sonho. Em nossa cultura, esquecer um sonho não é um grande problema. No entanto, na visão de muitos povos antigos, se um homem se esquecesse de seu sonho, isso significava que seu deus estava zangado com ele.
Os sábios de Babilônia admitiram a incapacidade de fazer o que o rei estava pedindo: “Não há nenhum mortal sobre a face da terra que possa fazer o que o rei exige. Nunca houve um rei, por maior e mais poderoso que fosse, que tenha exigido semelhante coisa de um mago, encantador ou caldeu. Isso que o rei exige é difícil, e não há ninguém que o possa revelar diante do rei, a não ser os deuses, e estes não moram entre os mortais” (Daniel 2:10, 11). Diante dessa resposta, que em parte estava correta, o rei usou seu poder e disse que, se não lhe dessem uma resposta, os sábios seriam despedaçados, e suas casas, reduzidas a ruínas (Daniel 2:5).
Sabedoria com as palavras
Veja que interessante os contrastes. Enquanto o rei se perturbou (verso 1), Daniel, quando soube do decreto de morte, falou com cautela com o chefe da guarda do rei (verso 14). Enquanto o rei falou palavras de ameaça (verso 5), Daniel usou palavras de prudência (verso 14). O rei ficou irado e furioso (verso 12), Daniel pediu oração a seus amigos e agradeceu a Deus a resposta (versos 17-19). O rei decretou a morte de todos os sábios (verso 13), Daniel intercedeu pela vida de deles (verso 24). Nabucodonosor deu três ordens e emitiu um decreto de morte (versos 3, 5, 8, 9, 12, 13), Daniel fez três pedidos e uma oração (versos 16, 18, 24, 20-23).
Por mais curioso que pareça, a explicação para um contraste tão gigantesco entre esses dois homens está nas palavras dos feiticeiros caldeus. Eles apresentaram a crença da época, que poderia ser resumida assim: “Sabemos que os deuses existem, mas eles estão muito distantes e não moram com os mortais.” Daniel e seus amigos também sabiam que existe um Deus. Porém, na visão deles, esse Deus é uma divindade pessoal que “revela os mistérios” a Seus servos (verso 28). A expressão “Deus do céu” é usada quatro vezes ao longo do capítulo, e cada ocorrência dela enfatiza o envolvimento de Deus na história humana (vversos 18, 19, 37, 44). Louvado seja Deus, pois Ele Se interessa e Se envolve com nossa história pessoal!
Foi essa visão, de um Deus próximo e que Se interessa pelos assuntos humanos, que fez com que Daniel se tornasse um homem de sabedoria e bom senso para enfrentar a fúria do rei. Crer em um Deus que ouve as orações fez com que Daniel confiasse na intercessão dos amigos. Saber que Deus protege Seus filhos o levou a ter misericórdia dos sábios que iriam persegui-lo.
Os detalhes proféticos do capítulo 2 mostram que Deus está no controle da história humana e das nações, mas os detalhes vistos acima mostram que Deus também está no controle da vida, das emoções e das reações daqueles que se submetem a Ele diariamente e permitem que sua história pessoal seja guiada por um Deus sábio e amoroso.