Violência contra professores expõe precariedade da educação brasileira
Agência Adventista de Notícias ouviu especialistas e analisou dados que mostram drama que vivem professores brasileiros
Brasília, DF ... [ASN] A violência no Brasil, com sua complexidade e abrangência, é estudada e analisada em categorias. E uma dessas categorias voltou a chamar a atenção de parte da opinião pública, nessa semana, por conta do episódio de agressão contra uma professora, de 51 anos, da rede pública estadual de Santa Catarina. A violência escolar tem várias características e especialistas tentam identificar suas razões e saídas para o problema.
Há algumas estatísticas disponíveis que permitem se fazer um diagnóstico do quadro. Uma pesquisa global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi realizada com mais de 100 mil professores e diretores de escola do segundo ciclo do Ensino Fundamental e do Ensino Médio (alunos de 11 a 16 anos). Essa pesquisa, que considerava dados até 2013, colocava o Brasil no topo de um ranking de violência em escolas. Na enquete feita com os docentes, pelo menos 12,5% deles, do Brasil, disseram ser vítimas de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana.
Já a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) chegou a divulgar, em março desse ano, dados relacionados à Prova Brasil 2015 (com vários tipos de informações e não apenas relativos à violência). De acordo com esse levantamento, 22.692 professores (9%) afirmaram já terem sido vítimas de ameaças feitas por alunos, e 4.714 professores (2%) foram vítimas de atentado à própria vida. Essa realidade é agravada quando se detecta que 13.015 professores (5%) já presenciaram seus estudantes sob efeito de bebidas alcoólicas em suas aulas, e 29.737 (12%), sob efeito de drogas ilícitas.
Veja reportagem recente sobre o assunto da violência contra professores:
[vimeo 230908693 w=640 h=360]
Pesquisa revela violência contra professores no Brasil - reportagem Jornal da Band from Felipe Lemos on Vimeo.
Possíveis causas e soluções
A avaliação da OCDE identificou possíveis causas da violência contra os professores. Um estudo feito pela Consultoria Legislativa da Câmara Federal, publicado em maio de 2016 e que se vale dos dados dessa pesquisa da OCDE cita que “nas escolas brasileiras também se verificam os maiores percentuais de ocorrência de intimidação ou ofensa verbal a professores ou membros da equipe escolar (12,5%) e uso/posse de drogas ou bebidas alcoólicas (6,9%). Os professores brasileiros são, ainda, os que declararam gastar mais tempo em sala de aula para manter a ordem (19,8% do tempo) e com tarefas administrativas (12,2%)”.
A professora Joyce Mary Adam, doutora em Gestão e Administração da Educação pela Unesp de Rio Claro/SP, estuda com profundidade o tema. Na sua avaliação, essa violência obviamente se dá pela falta de prevenção a partir do que ela chama de trabalho coletivo. Ou seja, uma cooperação entre gestores, diretores, professores e pais para elaborar regras de convivência no ambiente escolar, proporcionar mais tempo para os docentes trocarem experiência entre si e conhecerem melhor a comunidade escolar em que estão inseridos e mesmo estudar com mais profundidade como lidar com um aluno totalmente diferente do que se tinha há 30 anos. Hoje, conforme constata a pesquisadora, é impossível realizar isso, pois mais de metade dos professores de escolas públicas praticamente dão aulas em vários locais diferentes e não criam vínculo algum com os estudantes e muito menos com as famílias. “Essa realidade, com certeza, vai comprometer um projeto político-pedagógico consistente e é caminho aberto para a violência”, comenta.
Joyce advoga a ideia de que não basta apenas melhorar os salários dos professores (que são considerados muito baixos se comparados com a responsabilidade educacional conferida a eles), mas investir em infraestrutura para permitir que esses docentes se desenvolvam plenamente como apoiadores de uma educação mais completa dos estudantes.
Efeitos psicológicos
Além de um problema no âmbito educacional, a violência contra professores tem significativo impacto psicológico para as vítimas. A psicóloga Simone Bohry explica que “quando a violência ocorre dentro de uma escola e, especificamente de um aluno para o professor, a situação traz sérias consequências não apenas para a vítima, no caso, o professor, mas para todo o ambiente escolar (professores, funcionários e estudantes), dificultando e até mesmo impossibilitando o contexto de ensino-aprendizagem”.
Entre essas consequências psicológicas para a vítima, Simone enumera, por exemplo, sintomas emocionais como: medo, angústia, falta de atenção e perda da autoestima (devido passar a desacreditar em si e no próprio potencial) até mesmo adoecimento físico (desencadeamento de doenças psicossomáticas) e emocional como a depressão, ansiedade e o transtorno de estresse pós–traumático. [Equipe ASN, Felipe Lemos]