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Versões da Bíblia e a arte da tradução

Quais as diferenças entre a tradução formal e a dinâmica? Uma é melhor do que a outra? Ou ambas são válidas para o estudo?


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O atento estudante da Bíblia deve entender um pouco do que está por trás das traduções do texto bíblico. (Foto: Shutterstock)

Existem basicamente dois tipos de traduções bíblicas: equivalência formal e equivalência dinâmica. Neste breve ensaio, darei exemplos que mostram na prática essas duas abordagens.

A tradução de equivalência formal tenta, o máximo possível, estruturar de forma estrita e literal a ordem e o significado gramatical do idioma original. A Bíblia Almeida Revista e Corrigida, por exemplo, em português, segue essa abordagem ao traduzir Gênesis 1:1 da seguinte forma: “No princípio, criou Deus os céus e a terra.” A ordem no texto hebraico (idioma original de Gênesis) é exatamente a mesma usada por esta versão, colocando o verbo "criar" antes do sujeito "Deus".

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Por outro lado, a equivalência dinâmica foca na comunicação da linguagem, e não necessariamente na ordem gramatical e lexical usada pelos autores bíblicos. O importante, segundo seus defensores, é tornar o texto bíblico compreensível para os leitores e ouvintes modernos.

Em Mateus 1:24, o autor do evangelho diz literalmente que José “não conheceu” Maria até que ela desse à luz a Jesus. Em muitas versões formais, o verbo "conhecer" mantém seu sentido literal (Almeida Revista e Atualizada). Porém, na perspectiva dinâmica, a palavra é traduzida como ter relações sexuais (Nova Versão Internacional), permitindo ao leitor entender que Maria não permaneceu virgem para sempre. Isso cria uma ponte entre os leitores antigos, que teriam entendido a mensagem dessa forma, e os modernos, que precisam de ajuda para não pensar que José não sabia quem era Maria.

Recomendações para estudo

É importante destacar que nem as traduções de equivalência formal nem as dinâmicas são perfeitas. Por isso, é recomendável que o leitor da Bíblia use ambas. Uma limitação da perspectiva formal, por exemplo, é esquecer que nenhuma tradução é estritamente literal. Em Romanos 3:20, Paulo diz literalmente que, embora esteja ausente fisicamente, está com eles em espírito. Uma versão formal, como a Almeida Revista e Corrigida, traduz "carne" por "corpo", desviando-se do padrão literal do versículo. Por que não seguir a ordem exata e estrita do texto grego? A razão é simples. A palavra "carne" no versículo não tem muito sentido para alguém lendo a Bíblia pela primeira vez, obscurecendo seu significado original.

O mesmo pode ser dito sobre traduções dinâmicas, especialmente quando a comunicação da mensagem bíblica é transmitida com muita liberdade, comprometendo o sentido original de um trecho. Isso ocorre principalmente em paráfrases bíblicas e pode causar confusão doutrinária. A Nova Tradução na Linguagem de Hoje, por exemplo, traduz Romanos 3:24 assim: “Mas, pela sua graça e sem exigir nada, Deus aceita todos por meio de Cristo Jesus, que os salva.” O verbo "aceitar" é usado em vez da palavra grega para "justificar", o que obscurece o conceito paulino de justificação pela fé. No entanto, é importante destacar que a Nova Versão Internacional, uma tradução que favorece a equivalência dinâmica, usa o termo "justificar", mostrando que nem todas as versões desse tipo alteram palavras-chave teologicamente.

Abordagem intermediária

Uma abordagem intermediária é adotada pela Nova Almeida Atualizada, que segue a regra: “formal ou literal sempre que possível; dinâmico sempre que necessário”. O valor dessa abordagem é visto em Tito 2:13, traduzido na Almeida Revista e Corrigida como: “aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Senhor Jesus Cristo.” Traduzindo assim, não fica claro se Paulo se refere a duas pessoas, Deus e Jesus Cristo, ou se o grande Deus e Salvador é Jesus. A Nova Almeida Atualizada, por outro lado, traduz a última parte como: “… e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus.” No texto grego, tanto "Deus" quanto "Salvador" são determinados pelo mesmo artigo definido, indicando que ambos se referem à mesma pessoa, ou seja, Jesus. Portanto, Paulo estaria falando de uma pessoa, não duas, e a tradução dinâmica permite mostrar isso.

Em resumo, não existem versões perfeitas. Os exemplos mostram que toda tradução é, no final das contas, uma interpretação. Por isso, todo leitor deve consultar mais de uma versão das Escrituras e reconhecer que uma combinação de ambas as perspectivas, formal e dinâmica, é necessária para entender um trecho da Bíblia.

Embora Ellen White, profetisa e cofundadora da Igreja Adventista do Sétimo, nunca tenha escrito sobre o assunto, uma leitura rápida de seus escritos confirma o uso de várias traduções disponíveis em seu tempo. Esse uso tácito de versões confirma e ao mesmo tempo encoraja o cristão a usar outras traduções para entender o significado de um trecho ou história que pretende estudar ou meditar. Com isso, as possibilidades de entendimento da Bíblia, considerada a Palavra de Deus para os cristãos, aumentam e contribuem para o seu desenvolvimento espiritual.


Carlos Olivares é teólogo e professor de Novo Testamento do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp).