Por que ainda devemos estudar a Reforma Protestante?
A Reforma Protestante, com um dos marcos em 31 de outubro de 1517, ainda possui ecos importante hoje na maneira de se ler e interpretar a Bíblia Sagrada.
Todo o dia 31 de outubro ainda é uma data significativa para quem gosta de história e, especialmente, para quem deseja reavivar a compreensão sobre o movimento religioso conhecido como Reforma Protestante. Apesar de ter ocorrido na época medieval, com implicações basicamente na antiga Europa, a Reforma Protestante, sob o ponto de vista conceitual, produziu desdobramentos para muitas gerações.
Em mais um aniversário do dia em que Martinho Lutero, lá no ano de 1517, afixou no castelo de Wittenberg suas famosas 95 teses sobre a justificação pela fé, a Agência Adventista Sul-Americana de Notícias (ASN) conversou com um teólogo adventista sobre o tema. Glauber Araújo é mestre em Ciências da Religião e doutorando em Teologia Sistemática. Atualmente é editor de livros religiosos da Casa Publicadora Brasileira (CPB). Por esta editora, lançou, em 2017, o livro, organizado por ele, chamado A Reforma Protestante – Uma visão adventista.
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A Reforma Protestante é um marco histórico na civilização ocidental por razões políticas, econômicas e sobretudo religiosas. Fale de três principais contribuições, de forma geral, deste grande movimento para a atual forma de se compreender a Bíblia Sagrada e o próprio protestantismo.
Realmente, a Reforma Protestante conseguiu abrir as portas para muitas mudanças. No que se refere à compreensão da Bíblia, um dos métodos de interpretação bíblica utilizado durante toda a Idade Média – a alegoria – foi abandonado por uma leitura mais literal. Isso permitiu que a Bíblia fosse lida com novos olhos e que verdades antes abandonadas fossem resgatadas. A Bíblia também passou a ser o texto principal de estudos teológicos e doutrinários, deixando a tradição e o magistério da Igreja em segundo plano. Finalmente, a Reforma possibilitou, para muitos, a leitura do texto sagrado em seu próprio idioma, algo considerado impensável por muitos durante quase um milênio de cristianismo.
De maneira didática, que contribuições principais, nos escritos e estudos, você poderia enumerar de alguns dos principais nomes do movimento como Calvino, Melanchton, Lutero, Zuínglio, Martin Bucer, John Wycliffe, por exemplo?
Um dos primeiros reformadores, John Wycliffe, é conhecido pela Bíblia que carrega seu nome. Ele foi um dos principais responsáveis por traduzir a Bíblia do latim para o inglês, pavimentando, assim, o caminho para a reforma inglesa que se daria dois séculos depois. Martinho Lutero, também, percebeu o potencial que a tradução da Bíblia para o alemão representava, e tratou de executar esse projeto logo no início de sua reforma. No entanto, sua maior contribuição foi a disposição pessoal de enfrentar o clero católico e defender sua fé baseado unicamente no estudo da Bíblia.
Seu exemplo inspirou milhares por todo o continente europeu a fazer o mesmo. João Calvino foi um dos que, diante do exemplo de Lutero, decidiu conduzir a reforma na Suíça. Sua obra Institutas da Religião Cristã é até hoje utilizada entre reformados como modelo de sistematização teológica. Um reformador, que não é muito conhecido, mas que contribuiu significativamente para o futuro desenvolvimento da doutrina adventista foi Oswald Glait. Ele foi um dos primeiros reformadores a proclamar a santidade do sábado e a criar uma comunidade de sabatistas.
Reforma Protestante para hoje
Qual a leitura que o adventismo faz hoje da Reforma Protestante por conta do impacto deste movimento para a organização, inclusive interpretação profética?
Os adventistas do sétimo dia se consideram herdeiros da Reforma Protestante. Embora sejam movimentos religiosos separados por quase 350 anos, o ethos protestante corre nas “veias” adventistas. Somos um movimento que se esforça por exaltar a Bíblia como única regra de fé, e por restaurar as verdades bíblicas que se perderam ao longo dos séculos. Semelhantemente aos reformadores, temos um senso profético bastante aguçado, permitindo-nos compreender a solenidade dos tempos em que estamos vivendo.
Estas características moldam nossa compreensão da “verdade presente”, motivando-nos a sempre apresentá-la de maneira atualizada aos tempos em que vivemos e fundamentada na revelação profética. Por conta disso, entendemos que a reforma que se iniciou com Lutero e outros reformadores só encontrará seu fim quando alcançar “toda nação, tribo, língua e povo” (Apocalipse 14:6).
O que esperar do futuro? Conceitos da Reforma Protestante desaparecerão do imaginário dos cristãos no mundo ou serão retomados em alguma medida?
Para muitos protestantes, a Reforma acabou. Oficialmente, a reforma teria cessado após a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648). No entanto, os princípios defendidos e as verdades resgatadas durante esse período produziram frutos que podem ser notados atualmente na fé de milhares de pessoas ao redor do mundo. Conforme a Bíblia prediz, estas verdades deverão ser proclamadas ao mundo todo antes da segunda vinda de Cristo.
No entanto, notamos que também há um movimento contrário, desconstruindo e demolindo as verdades que a Reforma sustentou. O cristianismo hoje é muito mais segmentado do que nos dias de Lutero. E a fé de muitos parece estar mais fundamentada na tradição, na autoridade eclesiástica e na vivência própria do que na revelação. Ao comemorarmos mais um aniversário da Reforma Protestante, temos a oportunidade de refletir sobre os efeitos que isso produzirá e o que devemos fazer para nos manter fiéis à mensagem e à missão que Deus nos concedeu.