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Sobrevivente do Holocausto conta sua história para alunos de Colégio Adventista

Nanette Konig ficou quase dois anos no campo de concentração. Foi a única sobrevivente da família e conta como é viver o pós-guerra.


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Nanette recebeu homenagens durante a quinta-feira, 14 de maio. Uma delas aconteceu na Câmara de vereadores de SP. (Foto/ Marcos Júnior)

Nanette recebeu homenagens durante a quinta-feira, 14 de maio. Uma delas aconteceu na Câmara de Vereadores de SP. (Foto/ Marcos Júnior)

São Paulo, SP... [ASN] “Tudo que vocês ouviram sobre o holocausto podem ter a certeza de que foi bem pior”. Essa foi uma das frases que marcaram a apresentação de Nanette Konig, de 86 anos. A Holandesa, uma sobrevivente do holocausto que ocorreu na Segunda Guerra Mundial, contou aos alunos do fundamental I e II sua história de horror durante a perseguição aos judeus.

No Colégio Adventista de Vila Matilde, na última quinta-feira, 14 de maio, a frase “Nunca Mais Não Basta...” foi mais uma vez imortalizada.

“Eu represento todos aqueles que foram silenciados. Os poucos que sobreviveram, muitos deles não conseguiam falar, e realmente, é um certo esforço para falar. Por mim, eu acho que é uma missão dizer o que realmente aconteceu”, explica.

 

Um pedaço da nossa história

 Nanette é natural de Amsterdã, Holanda. Descendente de judeus, mora no Brasil com o esposo há mais de 50 anos e relembra vividamente de quando tudo começou no dia 10 de maio de 1940.

“Eu me lembro até hoje nos rostos dos meus pais a preocupação que eles tinham”, relata.

“A Holanda não se manteve neutra, ao contrário da Primeira Guerra Mundial. A família real saiu antes da captura. Nos entregaram para os nazistas”, conta.

 

Estrelas eram presas às roupas e diferenciavam judeus de alemães.

Estrelas eram presas às roupas e diferenciavam judeus de alemães.

Desde então a situação começou a ficar complicada para os judeus, que foram privados de utilizar meios de transporte público, comercialização e entrada em locais de entretenimento. “Nem sequer poderíamos brincar nas ruas, porque nós tínhamos uma estrela amarela que significa judeu. Era também perigoso, pois poderiam nos pegar”, explica e aponta a mão ao lado esquerdo do abdómen, local que era fixada a identificação.

“Também fomos obrigados a depositar todos os nossos bens em um banco nazista. Esses bens judeus financiaram a guerra dos alemães”, conta. Segundo Nanette, os bens confiscados e roubados durante a guerra nunca foram restituídos aos judeus.

 

Amizade com Anne Frank

A Alemanha fundou 25 instituições de ensino para separar a etnia alemã dos judeus em Amsterdã, foi no Colégio Liceu Judaico que Nanette se tornou amiga de Anne Frank.

Na parte esquerda da foto está Nanette Konig ao lado sua amiga Anne Frank.

Na parte esquerda da foto está Nanette Konig ao lado direito está sua amiga Anne Frank.

“Nós já éramos bem maduros para saber o que estava acontecendo. Todo mundo era amigo, nós estávamos sabendo que precisávamos ser bem unidos. A classe começou com 30 alunos e ao longo de dois anos eram 14. Só depois da guerra fomos saber o que aconteceu com os professores e alunos”.

Konig chegou a ver o diário, que foi publicado em 1947. “Eu fui para o aniversário em junho de 1942, ela fez 13 anos, eu vi o diário. No próximo mês eles se esconderam”, relata. A família de Anne Frank foi denunciada e logo foram separados e deportados para o Campo de Concentração.

 

A deportação para o Campo de Concentração

“Nós fomos deportados em 15 fevereiro de 1944, no campo de ‘estrela’, porque você poderia usar a sua roupa e tinha que usar a mesma estrela”, fala e aponta novamente para o abdómen esquerdo.

Judeus sendo transportados para os Campos de Concentração.

Judeus sendo transportados para os Campos de Concentração.

Naquela época, o transporte disponível para os prisioneiros eram vagões de trem específicos para transporte de gado. “Havia apenas um balde de água e outro para as fezes, eram dias de viagem até chegar ao local”, conta detalhes.

“O Campo de Concentração em Bergen-Belsen, na Alemanha, não era um campo de extermínio, mas se tornava por causa das condições lastimáveis que se encontravam lá”, relembra.

Pessoas com piolhos, desnutrição, doenças como diarreia pela falta de higiene e tifo faziam parte da paisagem nos alojamentos.

Nanette inicialmente ficou com sua família no campo até o pai, mãe e irmão serem transportados. Ela foi a única sobrevivente. “Eu estive frente a frente com a morte muitas vezes. Numa delas, um oficial apontou uma arma para mim e minha reação foi mostrar indiferença, pois estava desnutrida, pesando cerca de 30 kg e ainda com muitas dúvidas sobre tudo o que acontecia. Hoje estou aqui e acho que minha indiferença tirou o prazer dele em me matar. Fui salva pela indiferença”, conclui.

 

Reencontro com Anne Frank

Konig ficou um ano e meio no campo de Bergen-Belsen e teve seu último encontro com a amiga Anne Frank, que também estava no local. “Ela estava acabadíssima. Ela não tinha a condição de sobreviver a um ataque de tifo, infelizmente, ela estava totalmente acabada”, conta sua última lembrança de Frank.

Anne faleceu antes da guerra terminar devido a doença, apenas o pai sobreviveu.

 

Martijn Blitz e Helene Davids, pai e mãe de Nanette faleceram no extermínio.

Martijn Blitz e Helene Davids, pai e mãe de Nanette faleceram no extermínio.

Liberdade

A notícia do fim da Guerra não gerou surpresa para os prisioneiros. ”Estávamos tão fracos que não havia nenhum sentimento ou energia para comemorar”.

Para a sobrevivente, os alemães estavam intencionados quando não forneciam alimentos suficientes para a sobrevivência dos prisioneiros. “Foram encontrados estoques de alimentos guardados na dispensa. Estavam nos matando de fome!”.

Demorou um ano para que Nanette ingerisse comida sólida. “Me entregaram uma lata de leite condensado, eu comi uma colher, mas achei muito doce e não quis comer mais. Teve gente que comeu tudo e morreu. Eu sobrevivi mais um vez”.

Sobre as lembranças e pesadelos após a guerra Nanette comenta. “Você tem que aprender a lidar com os traumas. Você pode acordar no meio da noite suando frio e tem que saber lidar com isso. A mente humana não tem um botão de desligue. Tive que seguir em frente, ninguém quer uma órfã louca”.

 

Ensinamento

Para o estudante Pedro Susuki, 17 anos, é uma lamentável história que não pode ser esquecida no tempo. “Acho que deve ser lembrado o que aconteceu para que nós possamos evitar que aconteça novamente”, relata.

De acordo com o professor de história, Lucas Ferreira Junior, o objetivo é lembrar que essa é uma realidade que não está distante dos dias de hoje e é importante guardar os valores.

“A importância de falar em uma Escola Adventista que prega a esperança e um mundo melhor é de se espelhar em pessoas que conseguiram se agarrar na única esperança que tinham no campo de concentração e fizeram dela seu modo de vida, como a Nanette”

Ainda para Nanette, apesar dos traumas, os que sobreviveram conseguiram ter forças para restituir as famílias e seus ideais. “Eu conheço bastante sobreviventes, e a maioria era isso mesmo, a ideia de estabelecer uma família e dar graças a Deus de ter uma cozinha e panelas para cozinhar comida. Porque você levantar de manhã para tomar café não é um direito adquirido, é uma benção”, fala Nanette. [Equipe ANS, Michelle Martins]