Leo, Jessie e a lancha
Livro autobiográfico revela histórias inéditas de missionários pioneiros no Amazonas
A vida de alguns dá um livro. A de outros rende várias obras. Esse é o caso dos missionários norte-americanos Leo e Jessie Halliwell. Relatos da experiência do casal que deixou o conforto da classe média dos Estados Unidos para anunciar o evangelho nas regiões mais desafiadoras do Brasil, na primeira metade do século 20, foram produzidos por diversos escritores e pesquisadores ao longo das décadas. Luz na Selva, porém, não é mais um livro sobre o casal missionário. Trata-se de uma autobiografia de autoria de Leo Halliwell, publicada pela primeira vez em língua portuguesa.
O relato apresenta os desafios encontrados pela família Halliwell no Brasil desde sua chegada ao Rio de Janeiro, no começo dos anos 1920 até o final dos anos 1950, quando deixa a floresta amazônica e retorna aos Estados Unidos. Leo era engenheiro, e Jessie, enfermeira, ambos com boas perspectivas de trabalho e de renda quando decidiram se voluntariar para a missão. Eles trouxeram o filho pequeno para uma aventura que atravessou décadas e alcançou lugares onde poucos haviam estado antes.
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Esforços missionários
No livro, Leo Halliwell descreve a obra médico-missionária de sua família, principalmente entre os ribeirinhos e as comunidades indígenas da Amazônia, dando ênfase à questão sanitária. Doenças tropicais, como a malária, faziam muitas vítimas no norte do Brasil. Ao viver em meio a floresta, também sofriam com ataques de animais selvagens, como jacarés e cobras. Portanto, havia a necessidade de entregar medicamentos, prescrever tratamentos, realizar procedimentos cirúrgicos e ensinar hábitos de higiene.
Além das necessidades físicas, a família também atendia as necessidades espirituais e emocionais dos povos que viviam no rio: “Éramos pastor e médico, psiquiatra e casamenteiro, salvador de casamentos, padrinhos de milhares de crianças, grande parte das quais a própria Jessie tinha ajudado a trazer ao mundo” (p. 9).
Um retrato do Brasil na primeira metade do século 20
Luz na Selva traz também um retrato do norte e nordeste do Brasil na primeira metade do século 20 pela perspectiva de missionários estrangeiros daquela época. O autor dedica vários trechos a descrever a geografia dos locais por onde passou. Leo também se esforça para expor elementos da cultura dos povos com os quais teve contato: métodos de caça e pesca, hábitos alimentares, vestimentas, estrutura das casas, móveis etc.
Por exemplo, ele descreve: “O peixe é um dos principais alimentos do vale. Na maioria das casas, o cheiro está sempre presente, e quase sempre há peixes pendurados numa linha nos fundos” (p. 180). Dessa forma, por meio da obra, o leitor pode conhecer mais sobre a cultura brasileira dessa época e região.
Vida de sacrifícios
O que se destaca em Luz na Selva é o fato de que a vida missionária envolve muitos sacrifícios. Leo e Jessie Halliwell deixaram o conforto de sua terra natal e sua família; foram expostos às mesmas doenças e males que se propunham a tratar; sentiram a ausência de seus filhos durante sua formação educacional, entre muitos outros dramas comuns aos missionários interculturais.
Desse modo, Luz na Selva é um livro de grande inspiração aos missionários de hoje e uma motivação para novas conquistas de todos aqueles que desfrutam o resultado dos esforços e sacrifícios realizados há muitas décadas por Leo e Jessie. A história do casal Halliwell nos mostra como Deus alcança pessoas em locais aparentemente esquecidos por todos, cuida delas, cura suas dores e derrama Sua graça.
Essa luz continua brilhando com a dedicação e o sacrifício dos missionários atuais que, usando lanchas maiores e mais modernas, atendem às comunidades mais afastadas do Amazonas. Ela brilha também por meio de igrejas, escolas e instituições de saúde que são o fruto da semente lançada por esses pioneiros.
Max Pfeffer é editor de livros na Casa Publicadora Brasileira.