Notícias Adventistas

Projetos Sociais

Em busca de um recomeço

As histórias de perda e de lamento de moradores de Coronel João Sá, vítimas da maior enchente da história da cidade, que receberam apoio emergencial da ADRA na semana passada     “E eu ia ficar pra água tomar conta ‘de eu’, meu amigo?” A pe...


  • Compartilhar:

As histórias de perda e de lamento de moradores de Coronel João Sá, vítimas da maior enchente da história da cidade, que receberam apoio emergencial da ADRA na semana passada

 

Maria dos Santos, em Coronel João Sá, Bahia.

 

“E eu ia ficar pra água tomar conta ‘de eu’, meu amigo?”

A pergunta foi feita assim, com impaciência, pela doméstica Maria dos Santos, como resposta para outra pergunta, indagando por que decidiu correr e abandonar a casa, no dia 11 de julho.

Foi nesse dia que uma falha na barragem do Quati, a cerca de 20km, evidenciada pelas fortes chuvas, provocou um rompimento que gerou uma inundação na cidade de Coronel João Sá, BA, onde Maria mora, a 415 km de Salvador. João Sá fica abaixo da linha da barragem, o que deu força e velocidade às aguas de Quati.

A agressividade das águas provocou um tipo de estrondo, lembrou Maria. Mal deu tempo de pegar os documentos. Ela correu e tentou se abrigar onde fosse possível.

Quando o alagamento cessou, o saldo foi de desalento. As águas alcançaram mais da metade da casa onde mora, pintada de azul. Móveis, eletrodomésticos, roupas, alimentos. Perdas que causam insônia a Maria até hoje, com o pensamento recorrendo ao barulho das águas tomando conta de tudo.

Josefa estava em Sergipe quando as águas tomaram conta de sua casa.

 

Maria foi uma das pessoas beneficiadas pela ação de emergência do escritório regional para a Bahia da ADRA (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais), que fez a doação de 3 mil garrafões de água mineral para famílias desalojadas e desabrigadas.

 

O fogão eu consegui salvar"

 

Assim como Maria, Josefa Silva dos Santos, 55 anos, também foi beneficiada. Ela estava em Sergipe, Estado vizinho, quando a cidade sofreu o alagamento. “O fogão eu consegui salvar”, ela contou. “Mas perdi beliche, duas tevês, quatro camas, geladeira, roupa...”

A lista de Josefa se estende. Ela está agitada, reagindo a uma incerteza sobre como ficará sua vida agora. A mesma incerteza que aperta o coração de Ana Paula de Jesus, mãe de uma adolescente e uma criança. Quando Ana Paula recebeu a visita dos voluntários da ADRA, ela contou que sua casa seria demolida em poucos dias. Naquele momento, ela estava em casa, tentando resgatar um pertence qualquer. “Estou abrigada em um dos alojamentos da prefeitura. Mas não sei o que vai ser de minha vida agora, e de minhas filhas. Queria ter uma esperança”, lamentou.

Morando próximo ao Rio do Peixe, Adaílsa Matos viu o impensável: o encontro das águas do rio, que subiu acima do normal, com uma correnteza que descia a rua furiosamente em sua direção. O resultado foi ver a casa inundada, com a marca das águas mostrando ter chegado quase à metade da habitação. “Naquele momento, bateu um desânimo de viver aqui”, disse. Ela estava com sua avó quando recebeu a visita da equipe da ADRA. Mesmo com a força e a velocidade do episódio, Adaílsa conseguiu salvar alguns pertences.

Adaílsa Matos é vizinha do rio do Peixe, à margem da cidade.

Ouvi o furdunço na rua. Era a enchente acabando com tudo”

 

Tander Júnior Machado e seu primo, Marcelo Levi Oliveira, não tiveram a mesma possibilidade. Quando a equipe da ADRA chegou até sua casa, Tander tinha um olhar perdido no vazio, como se estivesse à procura de respostas, como se imaginasse estar em outro lugar e não ali, com sua casa revirada, um ambiente de entulho e lama. Não havia muito o que recuperar. “A perda foi grande demais e a casa está ameaçada, a prefeitura já avisou que vai demolir. A perda foi total”, disse. Para Tander, a ação da ADRA foi um alento. “Receber essa água pra beber é um presente”, ele afirmou, ao lado do primo Marcelo, com quem divide as perdas, a casa a ser demolida e agora também uma necessidade de recomeço na vida.

Morando ao lado de Tander, Maria Neide dos Santos mostrou sua casa, que também experimentou a mesma situação de perda. Neide tenta raciocinar sobre tudo o que aconteceu. “A chuva eu já sabia que vinha forte. Mas daí ouvi o furdunço na rua. Era a enchente que chegou acabando com tudo. Quando menos esperava a água tomou conta da casa. Perdi tudo”. Um lamento que se repete entre tantas outras histórias, espalhadas nos sete abrigos da prefeitura municipal.

Neyde ficou impressionada com a força das águas

Nascido e criado em Coronel João Sá, o marceneiro José Raimundo lembrou que, em 1972, o Rio do Peixe também subiu acima do normal e alagou algumas casas. Mas isso não foi nada comparado ao que houve agora, ele sentenciou. “A água veio aqui pela rua principal e foi acabando com tudo o que tinha pela frente”, disse. Sentado em sua moto, ele acompanhava a ação vigorosa da equipe da ADRA, preparando os garrafões de água para entregar à população. “É muito bonito o que vocês estão fazendo, vai fazer a diferença na vida desse povo”, concluiu.

 

É o tipo de esperança que os moradores do povoado Boa Sorte, que pertence à cidade, precisa. A ponte que une o povoado a Coronel João Sá ficou destruída e inacessível. Para os estudantes, ficou o lamento por não conseguir acesso aos colégios da cidade.

O agricultor Francisco Sales mostra a ponte destruída, dificultando a vida dos moradores no Povoado Boa Sorte

Quem mostrou o estrago foi o agricultor Francisco Sales. Ele está acostumado a passar pela ponte há 57 anos que mora ali. Agora, não consegue passar mais. A ponte tem cerca de 7 metros de altura. O nível da água ultrapassou 10 metros. “Nunca vi nada parecido antes. A inundação veio rápido e com muita força”, disse.

Nas ruas de Coronel João Sá, equipes de bombeiros e da guarda civil tentam ajudar as famílias. Buscam orientar para evitar que consequências da inundação provoquem doenças ou outros males associados a um ambiente de entulho e de caos. A prefeitura tenta atender mais de 14 mil pessoas afetadas, em uma população de mais de 17 mil moradores. Há muito o que fazer em Coronel João Sá e na cidade vizinha de Pedro Alexandre, também atingida pela força das águas. Nessa região do semi-árido da Bahia, a solidariedade humana será mais bem-vinda do que nunca.

Veja imagens da ação da ADRA: