Jerusalém de ouro – A encruzilhada das nações
Qual o significado do nome da santa cidade, e que relação ela pode ter com o nosso futuro?
O filme “Cruzada” (Kingdom of Heaven, 2005) foi uma das muitas produções cinematográficas tematizadas na história de Jerusalém. Ele retrata a reconquista da cidade pelos muçulmanos em 1187.
Num dos pontos altos da trama, os cristãos que viviam na cidade tentavam resistir ao inimigo, pois temiam a rendição. Eles ouviram como os cruzados tratavam as populações conquistadas anteriormente, e agora, esperavam o mesmo tratamento como vingança do inimigo. Então, Balian, rei da cidade, pediu para negociar com Saladino, que o recebeu em sua tenda enquanto os combates prosseguiam. Embora ninguém saiba o que conversaram na realidade, o filme recria um diálogo interessante:
Saladino: - Irá entregar Jerusalém?
Balian - "Antes de perdê-la, irei incendiá-la. Seus locais sagrados, os nossos... tudo em Jerusalém que leva os homens à loucura."
Saladino: "Talvez fosse mesmo melhor se o fizesse [com um leve sorriso]. Vai mesmo destruí-la?"
Balian: "Cada pedra!"
Saladino: "Mas sua cidade está cheia de mulheres e crianças..."
Balian: "Propõe um acordo?"
Saladino: "Darei salvo conduto a todos os cristãos que queiram deixar a cidade. Ninguém será ferido. Juro por Deus!"
Balian: "O que vale Jerusalém?"
Saladin: "Nada!!! [pausa] Tudo [rindo]"
Das telas para a história, realmente, Jerusalém sempre foi um sinal de contradição. Ela não teve os templos de Atenas, nem o poder de Roma. Não possui os monumentos da Europa nem os arranha-céus de Nova Iorque. Contudo, aproximadamente 4.2 bilhões de cristãos, judeus e muçulmanos (56% da população mundial) têm suas raízes culturais e confessionais ligadas a essa cidade. Nenhuma outra metrópole do mundo exerce tamanho fascínio. Todos, de um modo ou de outro, almejam Jerusalém.
Não é por menos que, desde longa data, escritos e lendas talmúdicas se referiam à cidade como “Jerusalém dourada”, uma expressão que inspirou Naomi Shemer a compor, em 1967, a bela canção Yerushalayim Shel Zahav (Jerusalém de ouro), que, para muitos, seria a canção oficial daquele precioso pedaço de chão.
O segredo de um nome
A literatura rabínica produzida nos primeiros séculos d.C. afirma que Jerusalém tinha 70 nomes. Muitos desses são os mesmos que aparecem no Antigo Testamento, a saber: cidade dos Jebuseus, cidade de Davi, Ariel, Monte Moriá, Monte Sião, Salém etc. Os árabes popularmente a chamam de “el Quds”, que quer dizer “cidade santa”.
O mais popular dentre todos é, sem dúvida, Jerusalém, que, embora ausente nos primeiros cinco livros de Moisés, aparece mais de 600 vezes nas demais Escrituras Judaicas.
As mais antigas menções extra bíblicas de seu nome se encontram nos tabletes de Ebla (século 24 a.C.), nos textos de execração egípcios (século 19 a.C.) e nas cartas de Tel el Amarna (século 14 a.C.). Em Ebla, ela é apenas chamada de Salém (como no Gênesis). Os textos de execração referem-se a ela como Rushalimum. Já as cartas de Amarna trazem três diferentes nomes: Urusalim (URU ú-ru-sa-lim), Urušalim (URU ú-ru-ša-lim) e Beth-Shalém (Casa de Salém).
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Mas é importante notar que, na cultura do antigo Oriente Médio, mais precioso que o nome ou sua grafia, é o significado que ele possui. O que significa, pois, Jerusalém?
Há tempos, os pesquisadores debatem, procurando uma resposta objetiva para essa pergunta. Vários significados são propostos. Um deles, baseando-se numa suposta etimologia sumero-acadiana, entende que, antes da conquista de Davi, o nome da cidade viria das palavras yrw e shalem, significando “fundação do deus Shalem”, uma divindade fenício/canaanita responsável pelo por do sol no mundo do além, e que seria, também, padroeiro da cidade.
Porém, uma outra proposta muito interessante é aquela que vincula a cidade à história de Abraão e seu nome a partir da junção de duas palavras bíblicas: Yireh e Shalem. O primeiro termo tem uma relação direta com Gênesis 22:14, onde Abraão, após ser poupado de sacrificar Isaque, renomeia o monte Moriá. Ele o chama, em hebraico, de Monte de Adonai-Yireh (ou Jeová-Jiré, conforme a popularização do termo no Brasil). O significado poderia ser “o Senhor vê, providencia ou habita”.
Shalem ou Salém seria o nome original da cidade onde Abraão se encontra com Melquisedeque em Gênesis 14:18-24. Muitos rabinos pensavam que Melquisedeque seria Sem, o filho de Noé, e Salém, a futura cidade de Jerusalém. Hoje, a maioria absoluta dos exegetas não aceita a primeira identificação. Contudo, quanto à cidade, são muitos os arqueólogos e historiadores que a identificam com Jerusalém. E Shalem seria uma referência ao hebraico Shalom, que quer dizer paz.
Aliás, o apóstolo Paulo mostra que “paz” é o verdadeiro significado da parte final do nome. Falando de Melquisedeque, ele diz: “seu nome significa "rei de justiça"; depois, "rei de Salém" quer dizer "rei de paz". (Hebreus 7:2)
Um antigo comentário judaico chamado Genesis Rabbah, composto entre 300 e 500 d.C., traz uma interessante justificativa para a junção dos dois nomes:
“O Santo [Deus], bendito seja seu nome, disse: “Se Eu chamar o lugar de Yireh, como o fez Abraão, Sem, o justo, reclamará. Entretanto, se tu me referir a ela como Salém, então Abraão, o justo, reclamará. Assim, resolvo chama-la de Yerushalayim (Jerusalém), de modo que seu nome contenha o modo como ambos a chamaram: Yireh Shalem”.
Completo, o nome Jerusalém seria Yerushalaim, ou, habitação da pazes, pois a grafia hebraica desta última parte sugere uma forma dual, daí “paz dupla”, que poderia, simbolicamente representar a paz terrena e a celestial.
Talvez, nem todos os que me leem terão a oportunidade de visitar Jerusalém. Contudo, um dos mais prováveis significados de seu nome me faz lembrar que a capital terrena de Israel é apenas uma sombra de outra Jerusalém celestial, que está reservada para todos aqueles que aceitam a Jesus como seu salvador pessoal. O visto de entrada nesta cidade está reservado pelo sangue do Cordeiro, não há razão humana que justifique rejeitarmos esse convite de viagem à cidade celestial.