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Coluna | Rafael Rossi

O novo papa e as profecias do Apocalipse

Como entender corretamente o que ocorrerá, à luz da Bíblia, e ter segurança nos planos divinos


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Compreender cenários proféticos - e o papel do papado - exige um atento estudo do texto bíblico (Foto: Shutterstock)

O falecimento do cardeal Jorge Mario Bergoglio, o papa Francisco, ocorrido neste 21 de abril, naturalmente alimenta especulações proféticas. Em círculos cristãos, sobretudo entre estudiosos das profecias de Daniel e de Apocalipse, muitos questionam se um evento dessa dimensão estaria relacionado ao cumprimento de sinais do fim.

Alguns recorrem à chamada “teoria dos sete papas”, iniciada em 1929, sugerindo que cada pontífice teria um papel cronológico específico em Apocalipse 17. Contudo, a interpretação bíblica e profética aponta que esse capítulo não delimita um número fixo de papas a partir do Tratado de Latrão (1929), mas, sim, descreve poderes e reinos que atravessam séculos. A Palavra de Deus ultrapassa qualquer tentativa de atribuir datas exatas para o fim do mundo ou de encaixar cada papa em supostas listas definidas.

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Historicamente, o papado demonstra continuidade institucional desde muito antes de 1929. Limitar a contagem de pontífices ao século XX ignora períodos chaves da formação do poder político-religioso de Roma, como o declínio do Império Romano e o surgimento da instituição papal como autoridade central no Ocidente. Portanto, ao abordar o falecimento do papa Francisco, deve-se ter em vista um processo histórico em curso, não um “salto profético” isolado.

Na teologia católica, afirma-se que a primazia do bispo de Roma remonta ao apóstolo Pedro, considerado o “primeiro papa”. A análise puramente bíblica, porém, não sustenta que Jesus tenha delegado a Pedro (e a sucessores) um governo universal incontestável sobre toda a cristandade. A famosa declaração “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja” (Mateus 16:18) deve ser entendida como referência à confissão de Pedro de que Jesus é o Messias, e não como a entronização de um líder infalível e supremo.

Com o passar dos séculos, entretanto, a Igreja de Roma acumulou poderes temporais e espirituais, reconhecidos em diversos concílios, sobretudo em meio ao vácuo político deixado pela queda do Império Romano. Em vários momentos, a ênfase na tradição gerou atrito com cristãos que defendem a centralidade das Escrituras (Sola Scriptura). A Reforma Protestante e o movimento adventista, por exemplo, buscaram devolver à Bíblia a posição de principal e infalível padrão de fé e prática.

Clareza profética

Quando um pontífice falece e começa o conclave para escolher seu sucessor, é comum que cristãos de diferentes denominações perguntem se ali estaria se cumprindo alguma fase final das profecias de Daniel e Apocalipse. Vale lembrar, porém, que apontar cada novo papa como o “último” costuma resultar em previsões com datas marcadas e depois desacreditadas. O que a profecia realmente questiona não é um indivíduo específico, mas o sistema que ele representa. Aquele que, ao longo da história, reivindica autoridade acima das Escrituras, em contraste com o ideal protestante e bíblico de que a Palavra de Deus é a regra suprema da fé.

Apocalipse 17 retrata uma figura feminina, a “grande prostituta”, sentada sobre uma besta escarlate, símbolo de um poder religioso apóstata, em oposição à “mulher pura” de Apocalipse 12, que representa o povo fiel de Deus. Na literatura bíblica, a mulher pura é a noiva de Cristo, ou seja, a verdadeira Igreja, enquanto a prostituta representa um sistema que abandonou a fidelidade ao Evangelho. É exatamente essa “Babilônia mística”, com suas doutrinas falsas, seu sincretismo e sua influência política, que o livro de Apocalipse denuncia como “caiu, caiu” (Apocalipse 14:8; 18:2).

O capítulo 17 introduz imagens fortes, como a “grande prostituta”, que embriaga as nações com o “vinho” de suas falsas doutrinas, seduzindo multidões que se deixam levar por uma religiosidade separada das Escrituras. Esse vinho se refere a ensinos como a substituição do batismo por imersão pelo batismo por aspersão, a ideia de uma alma imortal que vive consciente após a morte, a mudança do sábado bíblico para o domingo e a compreensão de um inferno em tormento eterno. Todos esses pontos, ao longo da história, foram gradualmente se firmando no imaginário cristão pela tradição, porém não encontram sólido respaldo bíblico quando analisados integralmente.

A profecia descreve também três poderes se unindo para reunir o mundo na batalha do Armagedom: o Dragão (Satanás e as religiões não cristãs ou seculares que se opõem à Bíblia), a Besta do Mar (identificada como o papado medieval que reviveu após sua “ferida” histórica) e a Besta da Terra ou Falso Profeta (protestantismo apostatado que corrobora práticas e ensinos divorciados da Palavra de Deus). Esses enganos demoníacos, segundo Apocalipse 16:13-16, culminariam num grande confronto, em que sinais e prodígios sobrenaturais, tanto em religiões não cristãs quanto dentro do cristianismo, procurariam legitimar práticas contrárias à vontade divina.

A palavra de ordem de Deus, em meio a essa confusão religiosa, é clara: “Sai dela, povo meu” (Apocalipse 18:4). Assim como uma criança que, em plena madrugada, corre para o quarto dos pais em busca de proteção, precisamos encontrar abrigo seguro na Palavra de Deus diante das trevas espirituais que se intensificam. Babilônia representa todo sistema que se afasta do testemunho bíblico e do caráter divino revelado nos Dez Mandamentos. Deus, porém, tem filhos sinceros espalhados em diferentes denominações e crenças (Apocalipse 18:4-5). Seu chamado amoroso não é para permanecermos em tais erros, mas para sairmos e abraçarmos plenamente a verdade.

Olhar voltado às Escrituras

O cristão que estuda a Bíblia é convidado a evitar sensacionalismos sobre contagens papais e interpretações estritamente cronológicas de Apocalipse 17, para não perder de vista o verdadeiro significado profético. Em vez disso, precisa reconhecer o papel histórico e sociopolítico do papado, sem ignorar as controvérsias decorrentes de exaltar tradições acima das Escrituras. A tentação de impor moralidade por meio de leis ou convenções político-religiosas não se coaduna com o espírito do Evangelho, pois o chamado divino é à conversão pessoal e à obediência voluntária, não à coerção política.

Ao mesmo tempo, esse compromisso com a Palavra implica acatar todo o Decálogo, inclusive o quarto mandamento sobre o sábado do sétimo dia, muitas vezes esquecido ou substituído por tradição humana. Equilibrar graça e lei é fundamental. Deus, em Sua bondade, oferece perdão e restauração, mas convida Seu povo a um estilo de vida coerente com Seus princípios. Se a Bíblia, e não a tradição, é o critério supremo, é preciso submeter cada doutrina ou milagre ao crivo das Escrituras (Isaías 8:20).

É imprescindível reiterar que o desenrolar final dos acontecimentos não depende de um único pontífice, mas do conjunto de poderes religiosos e políticos que se erguerão para desafiar a soberania divina. Por isso, a Igreja Adventista do Sétimo Dia convoca todos a voltarem-se para o “Assim diz o Senhor”, confiando na graça redentora de Cristo e sendo fortalecidos para obedecer a toda a vontade de Deus. Essa obediência, longe de ser legalismo, expressa amor e gratidão ao Criador e Redentor.

Seja qual for a mudança no cenário geopolítico e eclesiástico, incluindo a morte de figuras notórias ou a eleição de novos líderes, as orientações bíblicas permanecem firmes: “Falem e ajam como quem vai ser julgado pela lei da liberdade” (Tiago 2:12). Em Apocalipse, encontramos também um grito divino que rompe a escuridão: “Sai dela, povo meu” (Apocalipse 18:4). No plano espiritual, Cristo vem até nós, dizendo: “É hora de partir, venha, pois o lar seguro é por aqui.”

Li um poema intitulado Come Along Daddy (Venha Comigo, Papai), que descreve, de maneira comovente, a urgência desse chamado. Nele, uma menina de nome Sally sacrifica a própria vida ao tentar incessantemente conduzir o pai bêbado para fora da escuridão. Numa noite fria, ela o chama mais uma vez: “Vamos, papai, nossa casa é por aqui!” mas, já enfraquecida pela enfermidade que tinha, acaba caindo na neve antes de alcançar a segurança e morre.

Somente na manhã seguinte, o pai, agora sóbrio, se depara com a cena que escancara a gravidade de seu erro. Sally arriscou tudo nesse apelo, do mesmo modo que Deus nos convida a abandonar a “Babilônia” das falsas doutrinas e da religiosidade vazia, lembrando-nos de que, ao fim, só haverá dois grupos: os que persistem no engano e aqueles que, pela graça de Cristo, atendem ao chamado divino.

Portanto, diante de qualquer incerteza, seja na sucessão papal ou nas mudanças políticas e religiosas do mundo, a posição cristã mais segura é agarrar-se à revelação bíblica e ao convite de Deus. É tempo de levantar a voz, de proclamar a verdade presente e de viver em fidelidade ao Senhor que, em sua infinita misericórdia, chama cada filho a sair das trevas e da confusão espiritual, conduzindo-nos à luz de Sua Palavra, na esperança do reino eterno que Ele prometeu estabelecer quando voltar.

Rafael Rossi

Rafael Rossi

Em dia com o nosso tempo

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Formado em Teologia, é pós-graduado em Aconselhamento, mestre em Teologia Pastoral e doutor em Ministério. Atualmente é o diretor de Evangelismo da Igreja Adventista do Sétimo Dia para oito países sul-americanos e apresentador do programa Arena do Futuro, na TV Novo Tempo. @rafaelrossi7