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Coluna | Paulo Rabello

Desafios e bênçãos do campo missionário

Esse trabalho é um professor inigualável na arte de ensinar virtudes espirituais e moldar o caráter das pessoas.


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No Oriente Médio, as mulheres devem andar atrás dos homens e não contrariá-los

No Oriente Médio, as mulheres devem andar atrás dos homens e não contrariá-los

Por incrível que pareça, semana que vem (23/02/16) completamos um ano servindo no Oriente Médio. E embora mudar não seja novidade para a nossa família (já moramos no Sudeste, Sul, Centro-Oeste e Nordeste do Brasil, ao todo já foram 11 mudanças), nada foi tão radical quanto trocar as praias do Brasil pelo deserto das Arábias. Entretanto, abandonar o conforto do clima tropical para enfrentar a secura do deserto não foi o pior.  E olha que isso não está sendo fácil. Enquanto aí no Brasil vocês ainda estão curtindo o verão estamos aqui com a sensação térmica (fora de casa) de aproximadamente 8 graus. E isso depois de termos ficarmos “presos” dentro de casa por dois dias devido a uma tempestade de neve algumas semanas atrás. Em geral, no deserto ou se está extremamente quente ou frio. Temos apenas poucos meses de clima ameno e agradável durante o ano.

Pior do que o clima é a língua.  Só para se ter uma ideia, existe uma piada local que diz que a língua árabe vai ser o idioma do Céu. Por quê? Os árabes te respondem com um sorriso amarelo: “Porque você precisa da eternidade para aprender. ” Poucas coisas são mais frustrantes para um adulto do que não entender nada do que acontece ao seu redor.  Tentar se comunicar e não ser compreendido ou pior, ser o motivo da risada daqueles com quem você está tentando se comunicar.  E o que falar da cultura? Machista ao extremo. Homem ajudar em casa nos serviços domésticos é motivo de vergonha. Em público as mulheres geralmente devem andar atrás dos homens e expressar sua opinião ou contrariá-lo também não é visto com bons olhos. Algumas ainda são obrigadas a viverem sob o regime do véu e da burca. Diferente do Brasil não deve existir nenhum contato ou afeto em público, nem mesmo entre o marido e a mulher.  Entendemos isso na prática quando fui chamado atenção no shopping por ter dado um beijo na TESTA da minha esposa enquanto subíamos a escada rolante. Adicione a isso tudo o preconceito por sermos oriundos de um país “ocidental” (isso é sinônimo de mulheres seminuas, álcool, carne de porco a vontade e a constante idolatria aos diversos santos católicos).  A solidão e a saudade dos amigos e da família pesam profundamente o coração. O sonho de voltar a comer frutas e verduras em abundância, artigos vendidos a preço de ouro ou mesmo inexistentes por aqui pesam o estômago. Ah, o que eu não daria agora por um pastel e um caldo de cana?

Acredito que você está começando a entender um pouquinho o que significa estar distante no campo missionário. Todavia, não escrevo com o objetivo de ganhar a sua simpatia ou piedade. Tampouco somos uma família masoquista.  Os desafios realmente são tremendos e as linhas acima apresentam apenas de forma pálida um pouco do que estamos vivendo por aqui. Entendemos claramente que o chamado de Cristo nunca foi e nunca será fácil. Ao contrário, se Ele foi rejeitado e sofreu, o que nos faz pensar que a nossa vida de discípulos seria diferente da vida do Mestre?  Sua promessa, contudo, foi de que todo esse sofrimento seria temporário e valeria muito a pena.  E é exatamente isso que temos experimentado aqui.

As bênçãos são incontestavelmente maiores do que qualquer desafio ou sofrimento que enfrentamos até o momento.  Nunca crescemos tanto e em tão pouco tempo como indivíduos e como família.  Nunca nossos paradigmas foram tão radicalmente quebrados como nesse ano.  Nossa mente foi aberta a novas descobertas, novos costumes, pessoas, crenças, comidas, etc. Aprendemos em pouco tempo (e talvez da maneira mais dolorosa) lições preciosíssimas sobre paciência, adaptabilidade, perseverança, desapego às coisas materiais, confiança em Deus, entre tantas outras. Pela graça de Deus conseguimos transformar as dificuldades e os desafios em instrumentos para aproximar-nos mais uns dos outros como família e principalmente para aprender a depender mais de Deus.  Fomos “obrigados” a reorganizar toda a nossa vida tendo como alvo apenas o serviço. O campo missionário é um professor inigualável na arte de ensinar virtudes espirituais e moldar o caráter das pessoas para o Céu.

Louvamos a Deus pelo privilégio de estar aqui.  Sentimo-nos pequenos e incapazes de cumprir a grande missão a nós confiada.  Contudo, também já aprendemos que essa não é a nossa obra e sim a dEle. Somos apenas instrumentos pequenos e imperfeitos em Suas mãos.  Não deixe de orar por nós e tantas outras famílias que estão espalhadas pelo mundo esforçando-se para testemunhar do amor de Jesus. Maassalama!

Paulo Rabello

Paulo Rabello

Missão II

Até onde vão pessoas que se colocam nas mãos de Deus para servir na missão de pregar o evangelho.

Antes de ser teólogo, foi professor de inglês em empresas e nas faculdades de Letras e Tradutor/Intérprete do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp). Mestre em Liderança pela Universidade Andrews, hoje atua como pastor no Oriente Médio.