Interpretando o tempo em que vivemos
Há diferença entre conhecer as escrituras e compreender seu conteúdo
Nos textos anteriores você encontrará artigos de uma série com base em meu livro, Herdeiros do Reino, lançado pela Casa Publicadora Brasileira (CPB). Baseado no livro bíblico de Daniel, apresento lições que extraí dele para minha vida. Abaixo, compartilho com você uma versão resumida do quinto capítulo. Caso ainda não tenha lido os demais, acompanhe-os aqui.
“Todo cristão ou é um missionário ou é um impostor”, Charles Spurgeon.
O escritor Richard Dawkins é um conhecido biólogo evolucionista que tem produzido uma série de livros, artigos e vídeos defendendo o ateísmo. Ele criou, no website de uma fundação que leva o seu nome, uma campanha chamada de "Desafio da Blasfêmia". Esse desafio recompensa os participantes por demonstrarem, por meio de vídeos postados no Youtube, que não acreditam em Deus. Um grupo chamado “The Rational Response Squad” ou “Esquadrão de Resposta Racional”, investiu nessa campanha 25.000 dólares para encorajar os jovens a renunciarem publicamente sua crença em Deus.
Eu imagino que a maioria dos participantes desse desafio não faz ideia do que significa blasfemar. Na concepção bíblica, “blasfêmia” consiste em palavras ou condutas injuriosas à honra e à santidade de Deus”[1]. A Bíblia associa a blasfêmia ao pecado imperdoável: “Aquele que blasfemar contra o Espírito Santo nunca terá perdão, visto que é réu de pecado eterno” (Marcos 3:29).
O capítulo cinco do livro de Daniel é dedicado à história de um homem chamado Belsazar, que cometeu o pecado da blasfêmia. Belsazar não era o sucessor imediato de Nabucodonosor - outros quatro monarcas dirigiram a Babilônia entre ele e Nabucodonosor. Ele era, na verdade, o corregente da Babilônia. Seu pai, Nabonido, era o rei. Os eventos do capítulo cinco aconteceram na última noite do império babilônico, em 539 a. C. Nessa noite, o exército Medo-Persa tomou a Babilônia.
O exército inimigo estava cercando a cidade da Babilônia, e mesmo assim o rei decidiu oferecer “um grande banquete a mil homens importantes do seu reino e bebeu vinho na presença deles” (Daniel 5:1). Em algum momento da festa, a Bíblia diz que “enquanto Belsazar bebia e apreciava o vinho, mandou trazer os utensílios de ouro e de prata que Nabucodonosor, o seu pai, havia tirado do templo de Jerusalém, para que ele, os homens importantes do reino e as mulheres e concubinas do rei os usassem para beber vinho” (Daniel 5:2).
Uma ofensa consciente
Precisamos entender uma coisa sobre essa atitude do rei. Ele não pediu que os cálices sagrados fossem trazidos porque ele olhou para todos os lados na festa e não encontrou copos disponíveis para beber com os seus convidados. Naquele tempo as pessoas acreditavam que as guerras eram travadas entre os deuses e não entre cidades ou nações. Quando uma cidade era derrotada, eles imaginavam que o deus daquela cidade havia sido derrotado. Por isso, quando a batalha terminava, o exército vitorioso ia ao templo da cidade conquistada, tomava as imagens de escultura, as amarrava e levava com a população conquistada, para a cidade vitoriosa. As pessoas eram transformadas em escravos e as imagens dos deuses derrotados eram levadas para o templo do deus vitorioso. Um exemplo disso, descrito em I Samuel 5, é o fato de os Filisteus levarem a Arca da Aliança de Israel para o templo do deus Dagom.
Quando Nabucodonosor invadiu o templo de Jerusalém, ele procurou uma imagem de escultura que representasse o Deus de Israel para levar com os exilados para a Babilônia, mas como o povo de Deus não adorava imagens de escultura, os invasores decidiram levar os objetos sagrados usados no ritual do santuário. No começo do Livro, Daniel nos informa que “Nabucodonosor levou esses utensílios para a terra de Sinar, para o templo do seu deus, e os pôs na casa do tesouro do seu deus” (Daniel 1:2).
Quando Belsazar manda trazer esses objetos sagrados para serem usados na festa que estava realizando, provavelmente ele estava declarando que, assim como os deuses da Babilônia foram capazes de derrotar o Deus de Israel havia mais de cinquenta anos, eles também seriam capazes de derrotar os deuses dos Medo-Persas, que estavam fora dos muros da cidade.
Em Daniel 5:22 somos informados que Belsazar conhecia bem a seguinte declaração de Nabucodonosor sobre o Deus de Israel: “Deus, o Altíssimo, tem domínio sobre os reinos do mundo e os dá a quem ele quer.” (Daniel 5:21). Provavelmente ele conhecia essas outras declarações: “Certamente o Deus que vocês adoram é o Deus dos deuses e o Senhor dos reis” (Daniel 2:47). “Portanto, faço um decreto, ordenando que todo povo, nação e língua que disser blasfêmia contra o Deus de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego seja despedaçado, e que as suas casas sejam reduzidas a ruínas” (Daniel 3:29). Mesmo assim o rei decidiu blasfemar contra Deus, usando os objetos sagrados para tentar depreciar o Deus verdadeiro.
Grande ignorância
Nesse momento, Deus decide, em Sua soberania, ensinar uma lição ao rei e a todas as outras pessoas que estavam presentes na festa. A Bíblia nos informa que “Beberam o vinho e deram louvores aos deuses de ouro, de prata, de bronze, de ferro, de madeira e de pedra. No mesmo instante, apareceram uns dedos de mão humana, que começaram a escrever na parede caiada do palácio real, no lugar iluminado pelo candelabro; e o rei via os dedos que estavam escrevendo. Então o semblante do rei empalideceu, e os seus pensamentos o deixaram perturbado; as suas pernas bambearam, e os seus joelhos batiam um no outro” (Daniel 5:4-6).
O desespero do rei o levou a chamar os encantadores, os feiticeiros e os sábios do reino para fazerem duas coisas: ler e interpretar o que estava escrito na parede. Essas palavras são importantes na compreensão dessa história. O rei não queria apenas que eles lessem, pois aquelas palavras estavam escritas em aramaico, que era uma espécie de língua internacional no tempo de Daniel. O teólogo Siegfried Schwantes comenta o seguinte sobre as palavras na parede: “Tanto quanto possamos julgar, não havia nada particularmente misterioso quanto à escrita mesma ou o significado das palavras. Aparentemente qualquer um familiarizado com a escrita e o vocabulário aramaicos poderia ter lido as palavras. O problema consistia em descobrir o significado destas palavras naquela conjuntura histórica particular. De origem sobrenatural, elas exigiam uma sabedoria mais do que humana para acertar com seu significado fundamental. As palavras escritas eram as seguintes:
Mene é um particípio do verbo 'numerar', ou ‘contar’.
Tekel é um particípio passivo do verbo ‘pesado’.
Parsin é o plural da palavra aramaica ‘perez’ e significa ‘pedaços’.[2]
A pergunta a ser respondida é: se as palavras poderiam ser lidas, por que o rei precisou do auxílio de Daniel? O texto bíblico diz que o rei explicou esse ponto ao profeta com as seguintes palavras: “Acabam de ser trazidos à minha presença os sábios e os encantadores, para lerem o que está escrito na parede e me darem a sua interpretação. Mas eles não puderam dar a interpretação dessas palavras” (Daniel 5:15). Em outras palavras, os sábios conseguiram ler, mas não conseguiram interpretar o que Deus havia escrito na parede. Para isso Daniel havia sido chamado. Ele poderia interpretar o que os outros só conseguiam ler.
Hoje vivemos em uma realidade semelhante. O mundo olha para acontecimentos como fome, desemprego, corrupção, violência, doenças, terremotos, vulcões e consegue “ler” que alguma coisa está para acontecer no planeta. Mas, assim como Belsazar, o mundo observa esses acontecimentos com pavor e angústia. É por isso que Deus chama os Seus servos e servas para interpretar o que o mundo só consegue ler. Esse é o nosso chamado: anunciar que aquilo que o mundo vê com desespero, nós vemos com esperança.
Todos os sinais que apavoram o mundo são, na verdade, anúncios de que a nossa salvação está chegando. Devemos anunciar que esse mundo não irá acabar com uma pandemia, uma guerra mundial ou uma catástrofe natural, e sim com o glorioso retorno de Jesus a esta Terra, para levar-nos para a vida eterna. Talvez essa mensagem seja comum para você, mas para a maior parte da humanidade ela é desconhecida e fará diferença entre a vida e a morte. Todos os dias deveríamos sair de casa pedindo que Deus nos guie a pessoas com quem possamos compartilhar a verdade de que Jesus voltará para salvar aqueles que aceitaram a graça maravilhosa oferecida por Ele na cruz do calvário.
Referências:
[1] Lothar Coenen e Colin Brown, Dicionário Internacional de Teologia vol. I (São Paulo, SP: Vida Viva, 2004), p. 234
[2] Apostila de Siegfried J. Schwantes com comentários sobre o livro de Daniel, p. 54 e 55.Nos textos anteriores você encontrará artigos de uma série com base em meu livro, Herdeiros do Reino, lançado pela Casa Publicadora Brasileira (CPB). Baseado no livro bíblico de Daniel, apresento lições que extraí dele para minha vida. Abaixo, compartilho com você uma versão resumida do quinto capítulo. Caso ainda não tenha lido os demais, acompanhe-os aqui.