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Coluna | Heron Santana

O “Jogo do Tigrinho” da religião

Como evitar a aposta materialista na fé e promover a espiritualidade genuína


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A espiritualidade deve estar firmada em Deus, em seu amor, e não na prosperidade materialista prometida erroneamente (Foto: Shutterstock)

A Teologia da Prosperidade, surgida na década de 1940, defende que a abundância material é um desejo de Deus para seus fiéis. Ela ensina que prosperidade financeira é um direito cristão, e que pobreza e doença não representam a vontade de Deus.

Hoje em dia sua influência se amplifica. Com o marketing digital e influenciadores nas redes sociais, essa teologia muitas vezes se reduz a uma espécie de "aposta na fé" para adquirir recompensas materiais.

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Chamo isso metaforicamente de "Jogo do Tigrinho da religião", uma prática que transforma a fé em busca de prosperidade imediata, enfraquecendo os valores profundos do discipulado e da espiritualidade. No Brasil, o “Jogo do Tigrinho”, uma espécie de cassino online, é um problema econômico e social, especialmente entre as populações de baixa renda, que caem na ilusão de enriquecimento rápido através de apostas ilegais.

Estudos mostram que, só em agosto deste ano, pessoas contempladas pelo Bolsa Família gastaram R$ 210 milhões em apostas. Além disso, 20% dos usuários de casas de apostas online, as famosas bets, deixaram de pagar contas, e 12% substituíram a compra de comida por apostas. O impacto econômico é severo, drenando recursos que poderiam ser investidos em áreas produtivas, como educação e geração de renda.

Do ponto de vista religioso, essa "mentalidade de aposta" conduz à superficialidade espiritual, algo descrito por Dietrich Bonhoeffer, em seu livro Discipulado, como "graça barata", em que há pregação de perdão sem arrependimento e fé sem o real compromisso com Cristo. Na era do "jogo do tigrinho", a teologia da prosperidade oferece promessas de bênçãos sem a transformação genuína da vida, enfraquecendo o verdadeiro cristianismo, que se baseia no serviço e na generosidade.

A decepção inevitável para aqueles que não recebem as promessas de prosperidade é profunda, levando muitos a se sentirem abandonados por Deus ou manipulados por líderes religiosos.

O que igrejas podem fazer

Para combater essa tendência, igrejas podem promover uma compreensão melhor da Bíblia, do discipulado e da mordomia cristã. Quero fazer uma lista para refletir sobre iniciativas que ajudam a combater esta mentalidade.

  1. Enfatizar estudo da Bíblia enraizado no discipulado: Igrejas devem focar em uma teologia que enfatize graça, sacrifício e serviço, em um contraponto a retóricas e imaginários teológicos de redes sociais pautados em recompensas materiais. O discipulado autêntico envolve acolhimento, apoio mútuo e estudo bíblico.
  2. Promover a generosidade e o serviço: Espiritualidade verdadeira reflete altruísmo. Atos 20:35 lembra que "há maior felicidade em dar do que em receber". Igrejas podem transformar suas comunidades incentivando desejos e ações de serviço pautados pelo amor ao semelhante.
  3. Tornar mais comum e acessível o ensino sobre mordomia cristã: A mordomia cristã, quando devidamente ensinada, ajuda cristãos a compreenderem a fidelidade como reconhecimento da soberania divina sobre a vida humana, bem como a adoração incondicional como expressão de que tudo o que somos pertence ao Senhor. Essa visão precisa ser explorada, inclusive através da comunicação digital, pois ajuda a focar no crescimento espiritual através da oração, do estudo bíblico e de uma teologia saudável, promovendo a fidelidade como consequência do reconhecimento humano e aceitação da graça redentora em vez de benefícios materiais. Romanos 12:2 nos desafia a sermos transformados pela renovação da mente.
  4. Uso consciente das redes sociais: Igrejas devem usar as redes sociais para ensinar e inspirar, combatendo a cultura do "ganho fácil". E ajudar a promover valores de adoração, solidariedade e crescimento espiritual.


O "Jogo do Tigrinho" é uma metáfora crítica às práticas religiosas que substituem a espiritualidade por promessas de prosperidade. Para evitar esta mentalidade, as igrejas podem ajudar as pessoas a cultivar uma fé enraizada no relacionamento com Deus, no discipulado e no serviço ao próximo. E na compreensão do que está escrito em Provérbios 13:11: "Os bens que facilmente se ganham, esses diminuem, mas o que ajunta à mão, esse os aumenta".

Esse ensinamento é fundamental para orientar decisões financeiras conscientes e seguras, e evitar as manipulações teológicas que impedem de desfrutar das bençãos do discipulado de Jesus Cristo.

Heron Santana

Heron Santana

Igreja Relevante

Estudos e ações inovadoras que promovem transformações sociais e ajudam a Igreja a ampliar seu relacionamento e interação com a sociedade.

Jornalista, trabalhou na Rádio CBN Recife e na sucursal do Jornal do Commercio. Foi diretor da Rádio Novo Tempo de Nova Odessa, no interior de São Paulo, e hoje está à frente do departamento de Comunicação da Igreja Adventista para os Estados da Bahia e Sergipe.