Billy Graham e os ensinos sobre evangelização
Famoso evangelista faleceu em 2018, aos 99 anos de idade, e deixou algumas lições através de seu ministério
Willian Frank Graham Júnior, um filho de fazendeiros nascido na zona rural de Charlotte, na Carolina do Norte, em 1918, transformou-se em Billy Graham, o Pastor da América, o conselheiro espiritual de presidentes americanos, pregando uma mensagem de surpreendente simplicidade: Arrependa-se dos seus pecados, aceite a Jesus como seu Salvador e experimente o novo nascimento. Foi com esse discurso básico da teologia cristã que o televangelista mais influente da história dos Estados Unidos conseguiu pregar para mais de 200 milhões de pessoas, de 185 países, usando intensamente o rádio, a televisão e a internet.
Por meio de Billy Graham, a evangelização bíblica se tornou um fenômeno cultural americano. O televangelismo passou a ser mainstream, graças a um homem responsável por levar milhões de pessoas a decidir por um novo estilo de vida cristã, realizando cruzadas missionárias como a ocorrida em 1957, em plena Madison Square Garden, quando pregou para 2 milhões de pessoas durante 16 semanas consecutivas. Nesta quarta-feira, dia 21 de fevereiro de 2018, o pastor Graham faleceu, aos 99 anos, depois de lidar com doenças como câncer de próstata, hidrocefalia e Mal de Parkinson. A voz enérgica e apaixonada que pregou por mais de 70 anos a mensagem central da redenção silenciou. Resta o seu legado e o aprendizado que pode proporcionar para evangelistas da atualidade.
Em um obituário da mesma estatura que a do personagem, o jornal The New York Times lembrou que Billy Graham preencheu também na vida pública o papel de clérigio nacional. Ele foi conselheiro de presidentes como Dwight Eisenhower, Richard Nixon, Bill Clinton e George Bush. Em 1994, leu uma mensagem das Escrituras Sagradas durante o funeral de Nixon. Em setembro de 2001, conduziu um movimento de orações em favor das vítimas dos ataques terroristas de 11 de setembro. Desafiou a saúde já precária para viajar a Nova Orleans em 2006 para pregar e levar conforto e esperança para vítimas do furacão Katrina. Em momento algum, hesitou em pregar. O Wall Street Journal lembrou uma frase dita por ele em 1954: "Estou vendendo o maior produto do mundo. Por que ele não deve ser promovido, além de sabão?"
Em diferentes contextos
Esse pragmatismo para pregar o evangelho ao maior número possível de pessoas é uma das maiores lições de seu ministério. Billy Graham era um pregador, que cumpriu sua missão com uma voracidade capaz de transcender diferenças ideológicas, políticas e culturais. No mundo ainda em contexto da Guerra Fria, visitou a então União Soviética em 1982, pregando em igrejas russas. Aproximou-se de líderes totalitários como Kim Il-Sung, da Coréia do Norte, que o convidou para pregar em igrejas oficialmente sancionadas por Pyongyang. Desenvolveu relacionamento amistoso com a rainha Elizabeth II, do Reino Unido, fato destacado na recente série The Crown, produzida pelo serviço de streaming Netflix. Como resultado, em 1966, ele pregou para quase um milhão de pessoas em Londres. Em todo o momento, ele deixou claro que sua missão não era cuidar de um grupo de escolhidos, tutelando a fé de convertidos; seu propósito era conquistar o mundo com sua mensagem.
Famosas cruzadas evangelísticas
Sua obstinação com as cruzadas evangelísticas era tamanha que em 1949 ele criou o que se tornaria conhecido como The Billy Graham Rules, uma série de diretrizes que deveria ser adotada por ele e por seus colaboradores. Era proibido ser visto em reuniões, almoços ou qualquer outra situação com qualquer mulher que não fosse a esposa, para evitar má interpretação capaz de comprometer a pregação; ficou estabelecido que, a despeito das doações cada vez mais volumosas para a causa, viveriam de salário e usariam o recurso para a pregação do Evangelho, mais cara à medida que ampliava o campo de atuação para o mundo inteiro; definiu-se que o padrão de procedimento primaria pela integridade e transparência, de tal modo que os dados evangelísticos, quando não estivessem claros, deveriam ser arredondados para baixo, evitando qualquer deslize que levasse a uma interpretação corruptível. São princípios que foram criticados durante muito tempo, especialmente em relação ao posicionamento com as mulheres, acusado de misoginia e sexismo. Em um mundo como o de hoje, com todo o debate acerca de ideologia de gênero, pode haver grupos que apontem essa posição como uma mácula, mas estamos falando de um pastor na década de 1940, um pastor jovem, bonito, midiático, que teve a maturidade de criar códigos de conduta para proteger a causa missionária.
Humildade
Outro aprendizado fundamental da vida de Billy Graham é a humildade com que reconheceu erros e pediu perdão ao longo da vida. Sua aproximação com Richard Nixon o levou a um constrangimento mundial, quando teve conversas gravadas com o então presidente, com teor de antissemitismo, durante o Escândalo Watergate. Graham pediu desculpas e procurou se aproximar ainda mais da comunidade judaica. Em entrevista à Associated Press, em 2005, disse que um de seus grandes arrependimentos foi não ter participado ativamente da luta pelos direitos civis, na década de 60, lideradas por outro pastor, Marting Luther King. "Acho que errei ao não ter ido a Selma”, disse, relembrando a histórica marcha no Alabama realizada por outros líderes religiosos, liderada por King. "Gostava de ter feito mais", disse. Mesmo não tendo uma participação direta, Graham teve um relacionamento de amizade com Martin Luther King e foi duro em sua posição contra o racismo. “O racismo é um pecado precisamente porque nos impede de obedecer o mandamento de Deus para amar o próximo e porque tem suas raízes no orgulho e na arrogância. Os cristãos que abrigam o racismo em suas atitudes ou ações não estão seguindo seu Senhor neste momento, pois Cristo veio para trazer reconciliação - reconciliação entre nós e Deus, e reconciliação uns com os outros. Ele veio a aceitar-nos como somos, quem quer que seja, "de toda tribo e língua e povo e nação" (Apocalipse 5: 9)”, escreveu1.
Mobilização e engajamento
A morte de Billy Graham, um evangelista incansável que usou tecnologia, mobilidade, meios de comunicação, relacionamento e diplomacia para pregar a ideia central da teologia cristã, é uma perda para o cristianismo. O seu legado é uma dádiva para evangelistas da era digital. Nos dias atuais, com todo o acesso a tecnologias de comunicação e com a massificação das redes sociais, a mistura de simplicidade e paixão contida em seu ministério é uma inspiração para pregar a um mundo dominado pela ambivalência moral, relativização da verdade e egoísmo ético. Nunca foi tão necessário falar sobre arrependimento, aceitação e esperança.
- “Billy Graham sobre o Racismo”, artigo disponível em <https://billygrahamlibrary.org/billy-graham-racism/>