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Coluna | Emanuelle Sales

(Mais) um motivo para agradecer

"A aparência é um bônus em relação a um nariz e uma boca que funcionam”, reconhece Andy ao ver reconstruído seu rosto, desfigurado em tentativa de suicídio.


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Andy Sandness antes e depois do transplante de rosto, uma das cirurgias mais raras no mundo. Foto: Associated Press

“O que você espera do transplante? ”, perguntaram os médicos a Andy Sandness.

Ele apenas respondeu que queria um nariz que funcionasse, a capacidade de morder, mastigar e engolir, além de obter bons olhares ao invés de ruins. Andy, aos 21 anos, teve o rosto desfigurado após uma tentativa de suicídio. Às vésperas do Natal de 2006, em meio a uma crise emocional, ele pegou um rifle do armário, posicionou o cano da arma embaixo de seu queixo e puxou o gatilho. Mas o tiro não foi fatal. A polícia chegou ao local após o chamado de seus pais. O rapaz, que havia instantes tentara tirar a própria vida, implorava: "Por favor, por favor, não me deixe morrer! Eu não quero morrer!".

No hospital, ele conheceu o doutor Mardini, um cirurgião plástico especializado em reconstrução facial, que assegurou que consertaria seu rosto da melhor maneira possível. Mas o processo levaria tempo, e seriam necessárias várias cirurgias. “Eu só preciso que você seja forte e paciente”, disse o médico.

Andy cobriu o espelho do seu quarto de hospital com uma toalha, pois não suportava encarar sua própria imagem. Seu rosto não possuía mais nariz, nem mandíbula, nem dentes, e seus lábios quase não existiam mais. Além disso, ele havia perdido parte da visão do olho esquerdo e precisava, naquele momento, de tubos para respirar e se alimentar. Andy teve que se adaptar à nova realidade. Sua boca passou a ter cerca de uma polegada de largura, tornando impossível a alimentação com talheres. Então, ele cortava a comida em pedaços e os sugava até que conseguisse engolir. No lugar do seu nariz foi colocada uma prótese que constantemente caía, por isso Andy carregava uma cola para reposicioná-la.

Depois de 8 cirurgias e quase 5 meses de internação, Andy recebeu alta e voltou para sua casa, numa aldeia de 3,2 mil pessoas em Newcastle. Seus amigos e família o receberam calorosamente. Ainda assim, ele sentiu como se seu mundo tivesse encolhido. Evitava qualquer contato social. Sair em público se tornou um pesadelo.

Mesmo de volta à sua rotina, a perspectiva era de mais cirurgias, e isso o assustou. Não aguentava mais tantos enxertos de pele, cicatrizes e implantes dentários. Afinal, apesar de tudo, seu rosto ainda parecia deformado. Cinco anos haviam se passado desde a tragédia, e as visitas médicas não cessavam. Mas na primavera de 2012, Andy recebeu uma notícia que mudaria sua vida.

"Qualquer esperança que apareça"

O doutor Mardini, que já havia se tornado seu amigo, disse-lhe que a clínica Mayo, onde trabalhava, lançaria um programa de transplantes faciais, e que ele poderia ser o paciente ideal. O médico tentou controlar o entusiasmo de seu paciente, pois não queria iludi-lo. Apenas cerca de 24 transplantes haviam sido feitos em todo o mundo, e ele queria que Andy compreendesse os riscos dessa cirurgia tão invasiva. A maior preocupação era a possibilidade de o seu corpo rejeitar o novo rosto, além dos efeitos colaterais dos medicamentos pós-cirúrgicos — como câncer de pele, infecção, diabetes e enfraquecimento dos ossos.

“Pense muito sobre isso”, disse o doutor. Entusiasmado, Andy pesquisou bastante sobre a complicada cirurgia. Mesmo assim, não hesitou. “Quando você tem a aparência e a rotina que eu tinha, você pula em cima de qualquer esperança que apareça”, declarou. Mais de 3 anos se passaram até que o programa de transplante de face fosse aprovado na clínica. Além disso, Andy teve que passar por uma rigorosa avaliação psiquiátrica. Mardini e sua equipe dedicaram mais de 50 dias ao longo desses anos para ensaiar a cirurgia completa, usando cabeças de cadáveres, imagens 3D e ferramentas de cirurgia virtual.

Em janeiro de 2016, o nome de Andy foi colocado na lista de espera da United Network for Organ Sharing. O médico calculou que levaria cerca de 5 anos para encontrar o doador ideal, mas apenas 5 meses depois veio o telefonema: “Pode haver um doador disponível”. Mardini avisou Andy, mas o alertou de que era apenas uma possibilidade. No dia seguinte, receberam a notícia de que a família do doador tinha dado a permissão para o transplante. A decisão veio da recém-casada e recém-viúva Lilly, de apenas 19 anos, grávida de 8 meses. Seu marido, Calen Rudy Ross, de 21 anos, fatalmente atirou na própria cabeça. Mesmo devastada, ela se comprometeu a cumprir o desejo do marido de ser doador de órgãos. Quando os médicos analisaram a foto do falecido Ross, ficaram impressionados: "Sentimos calafrios quando vimos quão próximo eles estavam na cor do cabelo, na pele, apenas no olhar geral. Poderia ser seu primo". Ou seja, era o rosto ideal para o transplante.

No dia 16 de junho de 2016, Andy foi levado para a cirurgia. Cerca de 60 cirurgiões, enfermeiros, anestesistas e outros profissionais se reuniram para uma das operações mais raras do mundo. Levaram 24 horas para preparar o rosto do doador e praticamente o mesmo tempo para preparar Andy. A reconstrução do rosto levou mais 32 horas.  Ao fim da cirurgia, o doutor Mardini exclamou: "Um milagre".

Andy permaneceu sedado por vários dias, até que o tão aguardado momento chegou. Seu médico lhe entregou um espelho, e Andy Sandness, já com 31 anos, contemplou seu novo rosto — com nariz, bochechas, boca, lábios, mandíbula, queixo e até mesmo dentes, tudo de seu doador. Ainda sem conseguir falar claramente, escreveu aos médicos num caderno: "Ultrapassou as minhas expectativas". Seu pai conta: "Foi um momento de lágrimas, difícil de segurar... Para além de nossos sonhos mais loucos".

Andy conta que fica emocionado ao cheirar novamente, respirar normalmente e comer alimentos que na última década não conseguia, como maçãs e pizza. Ao sair em público, não percebe mais nenhum olhar estranho nem ouve sussurros. Ele diz: "Sou apenas outro rosto na multidão, e apenas pensar sobre isso me faz sorrir”. Em entrevista, ele declarou: “Uma vez que você perde algo que sempre teve, você sabe o que é não tê-lo. E quando você tem uma segunda chance de tê-lo de volta, você nunca esquece. A aparência é um bônus em relação a um nariz e uma boca que funcionam”.

Que tal murmurar menos? Que tal demonstrar mais satisfação pela vida? Não permita que o habitual se torne invisível aos seus olhos. Seja grato pelos detalhes. Lembre-se de que a grandiosidade de Deus é expressa nas pequenas coisas. Hoje é tempo de agradecer!

Emanuelle Sales

Emanuelle Sales

Imagem & Semelhança

Beleza e vestuário analisados segundo os critérios da Bíblia Sagrada em uma linguagem mais informal.

Jornalista, é criadora do blog Bonita Adventista e autora dos livros Espelho, espelho meu... agora o espelho é Deus; Imagem & Semelhança e Filha de Rei. Viaja pelo Brasil para palestrar sobre imagem cristã, autoestima e valorização pessoal.