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Coluna | Diogo Cavalcanti

Cativados pelo amor

A principal mensagem do livro do Apocalipse é o amor. Quer saber mais? Leia esse artigo.


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É com alegria que inicio esta coluna que trará algumas reflexões sobre as profecias bíblicas. Porém, antes de interpretar algum texto ou relacioná-lo a certos fatos, é imprescindível refletir sobre o essencial. Em primeiro lugar, precisamos nos questionar sobre a própria iniciativa de estudarmos as profecias bíblicas. Por que dedicar tempo a isso, se muitos consideram a Bíblia um subproduto da cultura? Se ela é fruto da cultura, não provém de Deus e não passa de uma invenção humana. É isso o que filósofos, historiadores e muitos teólogos afirmam. Se a Bíblia é apenas cultural, consequentemente, as profecias não passam de vaticinum ex eventum (profecia originada em um evento), ou seja, foram escritas após acontecimentos que foram deslocados para o futuro, a fim de parecerem proféticos.

Logo, é inevitável a pergunta: dá para confiar nas profecias bíblicas? Existe algum critério para avaliá-las? Sem dúvida, sim. O critério mais importante se relaciona ao cumprimento: uma profecia verdadeira tem que se cumprir. Basta a lógica para se chegar a essa conclusão. Até na Bíblia se encontra esse argumento: “Como conhecerei a palavra que o Senhor não falou? Sabe que, quando esse profeta falar em nome do Senhor, e a palavra dele se não cumprir nem suceder, como profetizou, esta é palavra que o Senhor não disse; com soberba, a falou o tal profeta; não tenhas temor dele” (Deuteronômio 18:21, 22, ênfase acrescentada). Enfim, se a profecia se cumpre, tanto ela quanto o profeta são verdadeiros. Se ela não se cumpre, é falsa. Ponto.

Alguns estimam que existam mais de duas mil e quinhentas profecias na Bíblia, sendo que a grande maioria delas já se cumpriu ao longo da história até o presente. Uma das mais espetaculares é a de Daniel 9:25 a 27, que anuncia o tempo da primeira vinda do Salvador. Escrita por Daniel no sexto século a.C., essa profecia indica o tempo exato da manifestação pública do Ungido (Messias ou Cristo), 483 anos a partir de outro fato também profetizado. Encurtando a história, isso nos leva a 27 d.C., exatamente o ano em que Jesus foi batizado (ungido) no rio Jordão. Como não se pode negar que o livro de Daniel foi escrito séculos antes de Cristo, também é inegável o caráter preditivo desse livro. Jesus veio no tempo profético exato.

Podemos mencionar diversas profecias cumpridas. Uma lista rápida: a destruição das antigas cidades de Tiro e Babilônia, vitórias e derrotas de exércitos, os 70 anos de exílio judaico, a diáspora, a sobrevivência do povo e da fé israelita por milênios, surgimento e queda de impérios, as profecias messiânicas e até mesmo os fenômenos políticos e religiosos da atualidade, como a união disfuncional da Europa e certas tendências globais. Tudo se cumpriu e está se cumprindo cabalmente, como previsto nas Escrituras.

Objeções

Muitos têm uma visão preconceituosa da Bíblia e imaginam que estudar as profecias pode até levar à loucura. Outros respeitam as profecias, mas, ao se deparar com um animal de sete cabeças e dez chifres, por exemplo, concluem que é impossível interpretar o livro. Talvez daí tenha se originado o ditado popular “bicho de sete cabeças”, para se referir a algo tão misterioso quanto assustador.

Ainda me lembro do meu primeiro contato com o Apocalipse, há 25 anos. Na época, tinha apenas dez anos de idade, quando vi um livro azul com os quatro cavaleiros na capa, intitulado Revelações do Apocalipse. Estávamos na casa de minha tia Luiza, professora formada em Letras, muito culta. Como em todas as férias de verão, viajávamos 3 mil quilômetros para passar alguns dias com ela, mas, naquela ocasião, o livro me incomodava naquela estante. Eu não gostava de passar por ele e até virava o rosto para evitá-lo. A capa azul chamativa, os cavaleiros (que nem eram tão agressivos) e a própria palavra “Apocalipse” pareciam ameaçadores para um garoto que nunca tinha manuseado uma Bíblia.

Não sei por que temia tanto aquele livro. Talvez a influência da TV. Minha memória não é capaz de resgatar essa informação. Apenas sei que o temor era real. Entretanto, em uma bela ironia da vida, anos depois eu me interessaria profundamente pela mensagem desse livro – não mais guiado pelo medo, nem vestido com um colete à prova de fé, mas atraído pelo amor divino (Jr 31:3). Nas palavras do autor do livro do Apocalipse, “no amor não existe medo; antes, o perfeito amor lança fora o medo” (1 João 4:18).

Amor divino

 Uma das primeiras lições para quem deseja estudar as profecias bíblicas, especialmente as apocalípticas (em outra coluna explico a diferença), é sobre o amor de Deus por Seu povo. O amor divino é a mensagem básica do livro, assim como de toda a Bíblia. Não é coincidência que Daniel e João tenham sido escolhidos para receber visões especiais. Ambos tinham algo em comum – Daniel era “mui amado” e João foi o “discípulo a quem Jesus amava” (Daniel 9:23; João 20:2). Ou seja, as maiores revelações proféticas da Bíblia foram confiadas a pessoas que foram objeto especial do amor de Deus, não por um decreto arbitrário da parte da Divindade, mas pela própria abertura que esses homens deram à luz celestial. Não se pareciam com pregadores agressivos, nem eram fanáticos insensíveis. Eram pessoas humildes, de profunda sensibilidade espiritual e comprometimento com o povo de Deus. Se pessoas amadas foram escolhidas para transmitir a mensagem apocalíptica, é porque ela tem que ver com amor.

“Deus é amor” (1Jo 4:8). Contudo, se o amor é a essência do caráter divino, por que tanto Daniel quanto Apocalipse contêm imagens negativas, como a de animais terríveis e cenas de destruição? A resposta para essa questão complexa não está em uma equação simples. Relaciona-se ao próprio dilema da realidade: se Deus é bom, por que Ele permite o sofrimento? Esta pergunta rendeu uma obra filosófica clássica, Ensaio de teodiceia, escrita pelo matemático e filósofo alemão Gottfried Leibnz. Nesse livro, Leibnz cunhou o termo teodiceia (que significa algo como “justiça de Deus”), em que procura conciliar a relação entre a bondade de Deus e a existência do sofrimento. Embora suas reflexões enriqueçam a discussão do tema, as profecias bíblicas dão uma contribuição enorme para a questão da teodiceia.

Para se entender o benefício das profecias bíblicas, vale a pena conhecer a história de Jó. Esse patriarca sofreu terrivelmente sem saber por que. Sendo o único em todo o Antigo Testamento chamado de justo, ou seja, uma pessoa altruísta e boa (Jó 1:1), ele sofreu terrivelmente. Contudo, nem passava pela sua cabeça que ele fazia parte de um conflito e que seus movimentos eram acompanhados com interesse por olhos invisíveis. No fim da história, o patriarca foi restaurado, e Deus até falou com ele, mas sem explicar o que houve. O patriarca permaneceu na escuridão quanto às acusações feitas contra ele na corte divina. No Apocalipse e em Daniel, o povo de Deus também sofre, mas o invisível é descortinado. Dá para se entender o porquê. Essa ideia está contida na própria etimologia da palavra grega apocalipse, que significa “revelação” e transmite a ideia de descobrimento, descerramento.

Por meio das profecias apocalípticas, temos a chance de entender o que está por trás do sofrimento humano e por que Deus parece lento em agir. Ao estudá-las, percebemos que Ele está atento aos detalhes e age vigorosamente. Somos abençoados com uma visão privilegiada da história. Aliás, do ponto de vista profético, história não se restringe ao passado. O futuro já é passado. Não é à toa que vários profetas falavam do futuro, usando verbos no passado. Deus não só antevê como influencia o futuro.

Assim, as profecias bíblicas não têm nada a ver com o que a cultura popular ensina. Apocalipse não significa fim do mundo, mas uma revelação de Deus. Não se trata de destruição gratuita, mas de intervenções divinas visando à redenção da humanidade. É a descrição de um Criador comprometido com Seus filhos, o qual concede liberdade, mas que também exige responsabilidade. Voltando à pergunta inicial, não é só bom quanto essencial estudar as profecias. Através delas, podemos entender por que estamos aqui e para onde vamos. Se devidamente estudadas, elas trazem paz e nos tornam mais reflexivos e confiantes – “Feliz aquele que lê as palavras desta profecia” (Apocalipse 1:3 - versão NVI). Ao ler esta coluna, que sua mente seja iluminada, e seu coração, aquecido pela revelação do amor de Deus.

Diogo Cavalcanti

Diogo Cavalcanti

Apocalipses

O universo das profecias bíblicas e suas respostas para as inquietações atuais

Formado em Teologia e em Comunicação Social, e pós-graduado em Letras, trabalha na Redação da Casa Publicadora Brasileira (CPB). É um dos editores de livros, entre eles, o Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia.