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Coluna | Carlos Nunes

Os gays, Babilônia e a Bíblia

Para entender o que é e como funciona a tolerância de Deus é preciso ler toda a Bíblia.


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Nas redes sociais continua polêmica sobre beijo gay no primeiro capítulo de novela brasileira.

Nas redes sociais continua polêmica sobre beijo gay no primeiro capítulo de novela brasileira.

"Alguns esclarecimentos importantes:

1. O casamento gay é facultativo. Ninguém no Brasil é obrigado a casar com um gay. Se você não é gay, a lei não lhe diz respeito.
2. O beijo gay é o mesmo que qualquer beijo. Ser gay é uma característica de pessoas, não de beijos. Não existe beijo negro ou beijo gordo. Ah, e também é facultativo. Ninguém é obrigado a beijar alguém do mesmo sexo.
3. A adoção de crianças por casais gays é quando um casal gay adota uma criança de um orfanato, não uma criança da sua casa. Se você não é gay e não é uma criança num orfanato, essa lei não lhe diz respeito.
4. A Globo é só uma emissora dentre muitas. Eu, por exemplo, só tenho Sky e na Paraíba a Sky não tem Globo. Ninguém no Brasil é obrigado a assistir a Novela das 9. Se assiste, é porque quer ver. Então veja.
5. Todos os programas no Brasil têm classificação indicativa. Nenhuma novela é aconselhável pra crianças de 6 ou 7 anos. Então se você estiver preocupado com seu filho ver beijo da novela das 9, então a Globo não é o seu maior problema. Vá ler o Estatuto da criança e do adolescente.
6. Se você é cristão, saia do Levítico e do Deuteronômio e vá ler o Sermão da Montanha e aprender o que é tolerância.
Parafraseando a Pitty: nenhuma mulher vai voltar pra cozinha, nenhum negro vai voltar pra senzala e nenhum gay vai voltar pro armário. Entendam isso."
Aqui no Peru não chega a ser um “case”, mas nas redes sociais por aí este texto acima teve grande sucesso em comentários e curtidas, especialmente por expressar o que há muito boa parte da sociedade formadora de opinião gostaria de dizer ou ver publicado! Pois gostaria de refletir sobre seu conteúdo, uma vez que toca direto em minha seara aqui nesse espaço opinativo. Ainda mais que o post vem em socorro aos ofendidos por campanhas contrárias à novela Babilônia nas redes sociais.
Em primeiro lugar, se observarmos com critério, perceberemos que todas as afirmações são, em realidade, informações que antecipam um comentário de juízo de conduta. É assim com o casamento, a adoção e o beijo gays. Vejamos: o casamento gay é facultativo. Ou seja, casa quem quer se assumir gay. Juízo de conduta: se você não é gay, recolha-se a sua insignificância, pois não é assunto que lhe diga respeito. O mesmo com relação ao beijo que, segundo seu argumento, é uma manifestação de carinho, amor, sentimento que não carrega sexo, cor ou peso. E que, portanto, é também uma escolha livre! Quanto a adotar uma criança, a autora afirma ser um caso de direito da criança de orfanato e do casal gay e que, se não somos criança ou gay, que fiquemos de fora!
A Globo e os programas de TV são também uma escolha livre baseada na informação. Se você não é obrigado a escolher a Globo e pode privar seu filho de ver o que não lhe é conveniente, por que está preocupado com isso?
E, finalmente, para o que nos interessa mais de perto, a informação que atinge ao cristão. Se você é cristão já deveria saber que a Bíblia vai além de Levítico e Deuteronômio. E, para estabelecer o juízo de conduta, a autora vai à recomendação: vá ao Sermão da Montanha e aprenda o que é tolerância!
Creio que se pode entender a lógica do raciocínio da autora como algo, em tese, correto. A informação precede a conduta, em maior ou menor grau. Um indivíduo informado tem mais condição de agir corretamente, se quiser... Mas é aí justamente que me permito contraditar. Há uma quebra no juízo de conduta baseado na premissa correta de que a Bíblia vai além de Levítico e Deuteronômio. Se vai além, vai além também do Sermão da Montanha!
Bom é conhecer que o Cristo do sermão do monte é o mesmo Cristo tolerante que afirma ser melhor perdoar e refazer o casamento, mas que, entre outras coisas, afirma que não reconhecê-lo como Senhor é um grave erro! E que no caso específico do sermão, afirma claramente: Exceto, diz o próprio Jesus, “em caso de relações sexuais ilícitas”. O que sabemos, por estudar e conhecer a Palavra e não superficialmente para encontrar o que nos convêm, é que relações sexuais ilícitas, com farta evidência, incluem especialmente práticas homossexuais. Encontramos um exemplo no capítulo 1 de Romanos: “pois eles mudaram a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a criatura (homem) em lugar do Criador [...] por causa disso, os entregou Deus a paixões infames; porque até as mulheres mudaram o modo natural de suas relações íntimas por outro, contrário à natureza; semelhantemente, os homens também, deixando o contato natural da mulher, se inflamaram mutuamente em sua sensualidade, cometendo torpeza, homens com homens, e recebendo em si mesmos, a merecida punição do seu erro”. Palavras do apóstolo Paulo que, ao iniciado em Bíblia, se entende suficientemente um autor bíblico inspirado por Deus para ali escrever. Ademais, compreender a Bíblia como um todo atende a um princípio de interpretação que vai bem além da Palavra Sagrada, se não que respeitado em toda ciência!
Claro, Deus e mais ainda, Cristo, é tolerante, pois ama a todo ser humano. Somente que o mesmo Deus que ama afirma em Apocalipse 3:19 que “repreende e castiga a todos quanto ama”. O mesmo Deus que ama, reprova condutas que não se harmonizam com seus ensinamentos... Eu, no caso do post, com base no acima exposto, publicaria o item 6 assim: Se você é cristão, saia do Levítico e do Deuteronômio e vá ler o Sermão da Montanha e toda a Bíblia para aprender até onde vai a tolerância de Cristo!

Carlos Nunes

Carlos Nunes

Ética Prática

Assuntos relacionados à ética sob o ponto de vista cristão e os dilemas enfrentados pelas pessoas no seu cotidiano.

Teólogo, atualmente exerce seu ministério pastoral no Peru. Jornalista profissional há mais de 20 anos, foi repórter nos jornais Diário Gaúcho e Zero Hora, e professor no curso de Jornalismo do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp).