"Sentimos o desejo de fazer a diferença", afirmam educadores que aliam ensino com vida cristã
Trabalhar como missionário fora do país é algo que atrai muitas pessoas. Mas esse grupo de professores mostrou que é possível unir a rotina cotidiana com a missão
*A apuração desta reportagem aconteceu entre Dezembro de 2019 e Janeiro de 2020, período anterior à pandemia do novo coronavírus*
História e Geografia costumam ser duas disciplinas que chamam a atenção de alunos interessados em entender as bases que sustentam as variadas sociedades humanas que habitam os cinco continentes. Baseadas na construção humana e no espaço ocupado por ele, essas disciplinas explicam para o estudante comportamentos e ações que afetam pessoas, cidades e países. Esse peculiar contexto acadêmico é a base do trabalho de Lilian Ferreira, professora da Escola Adventista do Sarandi, na Zona Norte de Porto Alegre. A docente dedica seu tempo para lecionar essas duas disciplinas para turmas do sexto ao nono ano. Ou seja, ela possui um contato direto com adolescentes que estão se preparando para encarar o Ensino Médio, a última etapa antes do Ensino Superior.
Mas Lilian não é uma professora comum. Ela aproveita a sala de aula para utilizar diferentes metodologias de ensino que visam aprimorar o aprendizado. “Eu tenho trabalhado com meus alunos a pedagogia ativa. Fazemos uso da internet e de jogos interativos”, explica. Sonhadora por ver seus alunos também aprendendo mais sobre Deus, ela aproveita essas aulas interativas para, eventualmente, despertar a curiosidade deles para temas bíblicos. “Em uma ou duas aulas, faço link com questões espirituais e organizo debates sobre esses assuntos”, compartilha. Lilian conta que a ideia de fazer esse jogo de união de História, Geografia e espiritualidade surgiu ainda nas férias. Foi um anseio por oferecer mais do que está escrito nos livros aprovados pelo Ministério da Educação (MEC).
“Senti o desejo de fazer a diferença como professora. Eu tenho a certeza de trabalhar em uma escola que não é comum. Por isso eu não queria mais ser uma professora comum. Vi que era necessário fazer alguma coisa”, afirma. Foi aí que Lilian pensou em ir mais além e criou um Pequeno Grupo (PG) dentro da biblioteca da escola, em moldes parecidos com os PGs frequentados por fiéis adventistas e amigos que estão aprendendo sobre as doutrinas da igreja. Para isso, a professora pensou que bastava organizar tudo e convidá-los para essas reuniões extracurriculares. No entanto, as coisas aconteceram de um modo um pouco diferente.
Ela conta que o primeiro desejo para pôr a ideia do PG em prática era estudar a Bíblia com apenas um aluno. Mas a iniciativa acabou chamando a atenção de mais adolescentes. “Contei para Deus que queria um aluno e ele me mandou vários. Um desses, inclusive, me abordou em plena aula de Geografia confessando o desejo de se batizar. ‘Professora, o que eu tenho que fazer para isso?’, ele me questionou. No mesmo momento eu agradeci a Deus e o convidei para estudar a Bíblia comigo. Desse momento em diante foi bem fácil aliar meu método de ensino com o evangelismo”, explica.
O que Lilian não esperava é que esse Pequeno Grupo, entre prateleiras de livros de Trigonometria, espaço geográfico e Grandes Navegações, fosse transformar a vida dela. “Eu precisei me colocar nas mãos de Deus para ter conteúdo espiritual para passar aos alunos. Esse novo trabalho me fez chegar mais perto de Deus e ter uma comunhão ainda maior com Ele”, comemora. As reuniões já têm dado resultado prático. Alguns alunos confessaram o desejo de fazerem parte da Igreja Adventista do Sétimo Dia e estão seguindo algumas doutrinas em casa, como a do descanso sabático. A professora também tem tido o apoio do serviço de capelania da escola, que é responsável pelo acompanhamento espiritual dos alunos e servidores. “Hoje nós temos algo em torno de 20 estudantes participando desse Pequeno Grupo”, afirma.
O PG acadêmico funciona às quintas-feiras, ao meio-dia. “Primeiro, nós fazemos um estudo bíblico tradicional. Também estamos fazendo um estudo da Bíblia em forma de game”, revela. O estilo pedagógico se insere no desafio que a professora propôs a eles, que é construir seu próprio estudo bíblico e levantar questionamentos para debates. “Eu os convido para usarem esse estudo feito por eles mesmos a fim de convidar outros alunos para participar”, desafia. Quando questionada sobre o significado de ser uma professora na Educação Adventista, Lilian responde que o local é um verdadeiro templo onde ela pode colocar seu talento em prática. “Como professora, eu me vejo responsável pela salvação de cada um deles. Então é ali que eu tenho que desenvolver meu ministério”, declara confiantemente.
A Escola Adventista do Sarandi também é palco de outra iniciativa de ensino alinhado com o evangelismo. Só que, em vez da sala de aula, o trabalho é feito no amplo espaço das quadras poliesportivas. O professor Marcelo Borba Guimarães leciona Educação Física para turmas do pré-escolar até o nono ano. Por ter contato com praticamente todas as turmas da unidade educacional, ele aproveitou isso para ser um educador de missão completo. “Tenho trabalhado com circuitos de exercícios, alongamentos, aconselhamento sobre saúde e os estimulando a viver uma vida mais próxima de Jesus”, recomenda.
Para fazer isso, o professor decidiu criar um Pequeno Grupo com um nome peculiar. “Foi então que criei o nome BOLA, que é formado pelas iniciais das palavras Bíblia, Oração, Lazer e Amizade. Fazia muito tempo que eu sentia o desejo de estudar a Bíblia com alguém, mas não conseguia ninguém. Após aconselhamento do capelão da escola, tive a ideia de criar o PG. Foi uma surpresa maravilhosa que Deus colocou na minha vida”, confessa. O BOLA passou a funcionar nos horários de intervalos das terças, em plena quadra de esportes. No início das reuniões, eles estudam a Bíblia e, em seguida, fazem atividades de lazer que estimulam a amizade entre os participantes.
O professor Marcelo entende que esse trabalho foi uma resposta a um anseio antigo de evangelizar e uma oportunidade de ver seus alunos se desenvolvendo harmonicamente de forma física, mental e espiritual. “Ser educador é deixar um pouquinho de mim para meus alunos e receber deles muito amor e alegria. Essa é a grande adrenalina que me move todos os dias a acordar cedo. Tenho muita paixão pelo que faço e quero cada dia ser mais parecido com o mestre Jesus porque meu magistério é um ministério”, almeja.
Metodologias Ativas
Enquanto dois Pequenos Grupos têm mudado a vida de estudantes da Escola Adventista do Sarandi, na mesma escola uma professora tem feito a diferença com uma faixa etária um pouco menor. Rejane Fogassi leciona na turma do quarto ano e deu início a estudos da Bíblia através do uso das chamadas metodologias ativas de aprendizagem. Trata-se de um método que possui como característica usar o aluno como agente principal no seu processo de aprendizagem, fazendo com que ele se comprometa com o envolvimento da sua própria educação.
O trabalho tem sido feito através de modificações da sala de aula. “A escola toda tem se mobilizado para trabalhar dessa forma. Isso me motivou bastante a dar seguimento a essa introdução de estudo da Bíblia nos momentos extra-acadêmicos. Eu vi que meus alunos gostam muito da classe bíblica com o pastor. Por isso quis aproveitar também para falar de Jesus na hora do recreio”, conta. Com isso, cada vez mais alunos passaram a procurar Rejane para saber mais sobre aquilo que era transmitido nas aulas de ensino religioso. “A cada encontro, eles manifestam o desejo de aprender mais e mais. Eles se motivam e encaram os desafios. Um dos métodos de ensino é o uso de jogos e isso tem chamado a atenção deles. Para mim, está sendo profundamente inspirador”, celebra.
Além dos jogos interativos, a professora usa o guia tradicional de estudos da Bíblia. Porém, a aula é adequada às necessidades e aos questionamentos dos alunos. “Nossos encontros acontecem uma vez por semana, na hora do recreio. Eu uso um dado gigante e estabeleço algumas regras que desafiam a turma. Por exemplo: quem joga o dado e tira o número 1 é desafiado a cantar um hino. Já quem leva o número 2 tem que falar um verso bíblico. A cada semana eu mudo os desafios e potencializo o aprendizado”, explica. Além disso, os alunos também levam perguntas para serem respondidas em casa, semelhantemente às tarefas exigidas pelos professores sobre os assuntos escolares. “É uma turma que adora desafios e questionamentos. Por isso foco tanto nessa técnica para aprimorar o aprendizado deles durante o recreio”, esclarece a professora.
Ao observar todo esse trabalho, a pessoa pode se perguntar de onde Rejane tira energia para, além da sala de aula, sentar-se com os alunos e dar continuidade à sua pedagogia nos momentos de folga. Ela explica que isso vem de um princípio pessoal que ela tem com o senso de cuidar da espiritualidade dos alunos. “Eu acredito que o professor cristão deve ser um instrumento nas mãos do Espírito Santo. Isso é uma coisa que me inquieta bastante e tenho como princípio o uso de dons. Pra mim, a vocação de ser professora é algo sagrado e precisa de amor. O magistério é regido por amor. Portanto, essa é a minha motivação para trabalhar dessa forma”, conta.
O amor descrito por Rejane é algo nítido no olhar de educadores da Educação Adventista, que buscam usar seus talentos para a salvação dos alunos. Esse trabalho está, inclusive, em total conformidade com os objetivos da Rede, que é ser uma forma de mostrar o amor de Cristo para crianças, adolescentes e servidores que dedicam sua força de trabalho nos prédios educacionais. Unindo educação e missão, esses professores trabalham arduamente para salvar e aproximar ainda mais a volta de Jesus.