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Coluna | Isael Costa

Quem são os 144 mil selados?

Como entender quem são e o que representam os 144 mil selados descritos nos capítulos 7 e 14 do livro de Apocalipse? Inspire-se com o caráter deste grupo.


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A Bíblia apresenta características daqueles que farão parte desse grupo (Foto: Shutterstock)

Sem sombra de dúvidas, o tópico 144 mil está entre os mais intrigantes não apenas do livro do Apocalipse, mas da Bíblia como um todo. É comum surgirem questões tais como: a quem se refere este número enigmático? Seria uma descrição de povos diversos ou apenas de judeus convertidos ao cristianismo? Seria uma referência aos salvos (judeus ou gentios) de todos os tempos ou apenas daqueles que passam pelo período de provação imediatamente antes da segunda vinda de Cristo? Ainda, seria um número literal ou simbólico? Vamos tratar de algumas dessas indagações e abordá-las, principalmente, com foco nos textos bíblicos de Apocalipse, capítulos 7 e 14.

Quem são eles em relação à época?

Num primeiro momento, trataremos da identidade cronológica deste grupo. É possível verificar se o texto apresenta algumas referências de tempo que auxiliem na situação da época referida aos 144 mil. Uma leitura cuidadosa certamente proporcionará a percepção de que esses selados, em Apocalipse 7, estão em relação cronológica com os sexto e sétimo selos. Conforme nota Osborne, “a passagem de 7:1-8 nos proporciona uma retrospectiva do período imediatamente anterior ao derramamento do juízo divino, e o texto de 7:9-17 nos leva adiante para o período posterior a esses juízos.”[1]

De fato, a descrição dos 144 mil logo após ao clamor dos perdidos, no capítulo 6, é a resposta a esta indagação e revela quem, nos últimos dias, estará em pé no ato da segunda vinda de Jesus[2]. Em linguagem militar, é expresso que os 144 mil, o exército de servos de Deus alistados para a guerra santa, prevalecerão durante a visitação final[3]. Sua localização no desfecho do conteúdo descritivo do sexto selo sugere um interlúdio ou pausa para salientar, de maneira mais direta, o cuidado e recompensa do Senhor quanto ao Seu remanescente fiel.

Deste modo, as duas cenas do capítulo 7 (os 144 mil e a grande multidão de glorificados) atuam enquanto um interlúdio e mesmo um ápice das experiências do povo de Deus. Como Beale destaca, a repetição de histêmi (subsistir), em 6:17 e 7:9, mostra que a pergunta: “Quem poderá subsistir?”, de 6:17, é respondida pela “grande multidão [...] em pé diante do trono”, em 7:9.[4] O fluxo das cenas, portanto, sugere que no devido fim dos tempos haverá um grupo rebelde e desprovido de proteção que enfrentará o juízo divino. E, também, um exército de fiéis protegidos e louvando a Deus pela libertação. E este é o clímax de sua experiência.

Relação com o capítulo 14 de Apocalipse

Outro indicador de tempo para os 144 mil seria a relação com o capítulo 14. Ali se apresenta este grupo tendo o nome de Deus sobre a fronte, o que seria paralelo ao selo do Deus vivo no capítulo 7. Neste caso, a referência ao nome de Deus sobre a fronte aponta para um grupo distinto de fiéis que faz contraste com os demais povos da Terra, os quais nos últimos dias recebem o selo-nome da besta sobre sua fronte. É um grupo que, no capítulo 6, sofre a ira do juízo divino. Em outras palavras, enquanto no capítulo 13 um grupo amadurece em rebelião contra Deus e se identifica à besta recebendo o seu selo-nome, neste mesmo tempo o texto bíblico revela um outro grupo amadurecido e selado com o nome de Deus e do Cordeiro sobre sua fronte.

As passagens se correlacionam paralelamente. Enquanto no capítulo 6 os perdidos dos últimos dias clamam aos montes para que caiam sobre eles, os salvos dos últimos dias, em 14:1-5, são vistos selados com o Cordeiro sobre o Monte Sião. A cena dos 144 mil, em Apocalipse 14:1-5, apresenta a glória reservada àqueles que perseveram sob os ataques perseguidores da besta nos últimos dias segundo Apocalipse 13:11-18. Fatos que situam esse grupo na época imediatamente antes da segunda vinda.

Quem são eles em relação à quantidade?

Embora haja a proposta de que este seja um número literal, essa opção enfrenta alguns problemas que a torna inviável. Ou seja, se o número necessariamente for tomado literal, seu contexto imediato também o deve ser. Nestes termos, os 144 mil selados obviamente seriam compostos de judeus homens condicionados à guerra, o que exclui a presença de crianças, mulheres e mesmo homens acima dos 40 anos.

Acrescenta-se, ainda, a informação de que seria um grupo de solteiros que nunca tiveram vida íntima com mulheres porque são castos-virgens (14:4). Além disso, a sugestão de literalidade quanto a esse número encontra o problema da ascendência biológica das doze tribos que praticamente se estilhaçaram no período do exílio e grande parte era absolutamente inexistente nos dias de João.

Identidade do grupo

Um outro fator importante para categorizar os 144 mil seria a noção de uma característica de escrita que João parece seguir. É dito reiteradas vezes que João ouviu alguma coisa e, então, virando-se vê outra. Porém, o que ele vê não é algo essencialmente diferente daquilo que ouvira, e sim a mesma coisa descrita em outras palavras.[5] Ou seja, em Apocalipse 1 ele ouve acerca de “uma voz como de trombeta” e então vê um como o Filho do Homem, ambas informações referentes a um único ser, Jesus Cristo.

Ouve acerca de “sete igrejas” e, então, vê sete candeeiros de ouro. De maneira semelhante, e não duas realidades distintas, mas duas descrições do mesmo objeto, no caso, as sete igrejas da Ásia. Este mesmo padrão se dá em Apocalipse 5:4-5; 17:1-3 e 21:1-3. Logo, este fenômeno não deveria ser ignorado no capítulo 7. Nele, João ouve um número de selados e então vira-se e vê uma multidão que ninguém podia enumerar, de modo que aqui não teríamos duas realidades diferentes, mas sim duas descrições da mesma coisa, ou seja, os 144 mil e a grande multidão do capítulo 7 são duas descrições do mesmo grupo de pessoas.

Deste modo, as duas cenas dos 144 mil e a multidão incalculável se tratam de duas imagens descritivas da mesma mensagem: Deus protege e salva o seu remanescente. A segunda cena fortalece e amplia a primeira.[6] É significativo, neste segmento, o proposto por Jacques Doukhan de que as duas cenas sejam descrições do mesmo grupo em dois momentos distintos[7]: a primeira o exército militante em pé pelo Senhor e sua causa nos últimos dias e a segunda esse mesmo exército triunfante na glória eterna.

Veja vídeo sobre o assunto:


Referências:

[1] Osborn, Grant R. Apocalipse: Comentário Exegético. 1 ed. São Paulo: Edições Vida Nova, 2014, p 338.

[2] LaRondelle, Hans K. How to Understand the End-Time Prophecies of the Bible: The Biblical-Contextual Approach. Sarasota, FL: First Impressions, 1997.

[3] Doukhan, Jacques. Secrets of Revelation: The Apocalypse Through Hebrew Eyes. Hagerstown, MD: Review and Herald Pub. Association, 2002.

[4] Beale, G. K. The Book of Revelation. New International Greek Testa­ment Commentary. Grand Rapids: Eerdmans. Beasley-Murray, G. R.  1999, p 405.

[5] Stefanović, Ranko. Revelation of Jesus Christ: Commentary on the Book of Revelation. Berrien Springs, Mich: Andrews University Press, 2009.

[6] Bauckham, Richard. The theology of the book of Revelation, New Testament theology (Cambridge: Cambridge University Press, 1993), p. 76.

[7] Doukhan, Jacques. Secrets of Revelation: The Apocalypse Through Hebrew Eyes. Hagerstown, MD: Review and Herald Pub. Association, 2002.

Isael Costa

Isael Costa

Conexão Profética I

Profecias, no seu contexto, explicadas para quem quer entender o tempo em que vive.

É casado com Lea Cristina Rodrigues Costa Souza e pai de Ayla Rebeca. Pastor há nove anos, sendo três destes como professor de teologia. É mestre em Interpretação e Ensino das Escrituras pelo Seminário de Teologia da Faculdade Adventista da Bahia. Atualmente trabalha como professor de Antigo Testamento do Seminário Adventista Latino Americano de Teologia e atua como editor-chefe da editora da Faculdade Adventista da Bahia (Fadba).