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Comportamento

Experiência é fundamental na relação das pessoas com igrejas

É o que afirma especialista em neurociência aplicada às relações entre consumidores e marcas. Billy Nascimento aposta na experiência


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Billy: " A experiência é uma porta de entrada, uma forma de comunicação, linguagem e conexão, para abertura de uma mensagem". Foto: Divulgação

Brasília, DF … [ASN] O conceito de economia da experiência não é novo e muito menos algo distante da realidade. No início dos anos 90, o sociólogo alemão Gerhard Schulze já falava do termo Sociedade da experiência. Mas, em 1998, os autores Joseph Pine II e James Gilmore previram o surgimento da economia da experiência como uma sucessora da economia voltada à agricultura, indústria e serviços. Ou seja, os consumidores cada vez mais buscam de uma experiência com aquilo que consomem (produtos, serviços, ideias, conceitos) e isso muda completamente a forma como as marcas (e as organizações) lidam com seus públicos. A Agência Adventista Sul-Americana de Notícias (ASN) resolveu conversar com um profissional que estuda profundamente essas relações entre as pessoas e as marcas a partir de uma visão mais ampla. Trata-se do biomédico, mestre e doutor em Fisiologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Billy Nascimento.

Ele desenvolveu sua tese de doutorado na área de pesquisa denominada neuromarketing, aplicando o conhecimento de neurociências para aprimorar as imagens de advertências sanitárias encontradas nos maços de cigarro brasileiros. Nascimento é sócio-fundador da Forebrain Neurotecnologia Ltda., empresa brasileira pioneira a desenvolver serviços de pesquisa em neurociências aplicada.

Os teóricos Joseph Pine II e James Gilmore, no final dos anos 90, argumentavam que a economia da experiência tem a ver com conceitos que mexem com as sensações ou que sugerem algo memorável e pessoal e não mais apenas a venda convencional do produto ou serviço. Por que levou tanto tempo para as organizações compreenderem isso?

Na verdade as organizações já haviam começado a entender que os valores econômicos de nossa cultura econômica já estavam mudando, e a partir disso iniciaram um processo de adequação e aprimoramento da área de experiência do consumidor, algo que antes não era visto de maneira tão separada dos serviços. A bem verdade, até hoje se pensa em experiência como um atributo dos serviços, e não como um ente econômico distinto, assim como os serviços são dos produtos.

Fato é que hoje os consumidores (e por que não as pessoas?) buscam cada vez mais experiências que vão além de atributos e benefícios racionais. Elas buscam experiências sensitivas e memoráveis que possam trabalhar suas emoções e prazeres. Essa é a realidade de consumo contemporâneo, que já demonstra, segundo os próprios autores, um desgaste, ou na linguagem técnica uma comoditização, da economia da experiência, abrindo, então, a oportunidade de criação de uma nova relação de consumo baseada no conceito de transformação.

Aqui, muito mais do que envolver emocionalmente a pessoa na experiência, o papel preponderante em que o consumidor quer se envolver nas relações de consumo é perceber como aquela marca se propõe a transformar o mundo, a sociedade, ou mesmo somente o consumidor. A economia da transformação é a nova fronteira na criação de valores que mobilizará a maior parte da população nos próximos anos.

De que forma a economia da experiência pode ser interessante para uma organização religiosa, como a Igreja Adventista, que não fabrica necessariamente produtos ou fornece serviços com a intenção comercial?

Nós vivemos em uma sociedade de consumo, onde o consumo não se limita a relações comerciais, e sim, a todas as relações humanas. A implicação disso é que em uma economia de experiência eu desejo ter interações com qualquer instituição que possa me promover a melhor experiência.

Dentro desse conceito a escola, o governo, os hospitais, a igreja, precisam entender o que é construir ações e relações que promovam uma experiência genuína com seus públicos. Enquanto instituições mais antigas, a maior resistência é a perda da essência da função destas instituições, entretanto, hoje esta é a maior oportunidade a ser criada: utilizar a linguagem contemporânea da economia da experiência para atingir as pessoas em uma linguagem que ela entenda e queira se envolver.

Nesse vídeo, Joseph Pine explica um pouco da ideia da economia de experiência:


Não  há um risco de se “vender” uma experiência aos templos adventistas, por exemplo, e o “cliente” depois constatar, na prática, que não é nada do que havia sido dito a ele?

A economia da experiência parte do princípio que as soluções de produto e serviço são as melhores possíveis. Só assim nasce uma oportunidade de experiência, pois a entrega do produto ou serviço já é dado como a melhor possível.

Quando há uma dissonância entre o que se divulga de experiência e a própria realidade da experiência, temos um grande problema, pois o cérebro das pessoas cria expectativas que moldam nossas motivações e que, por fim, nos influenciam para as decisões. Uma expectativa de ir a um ambiente de alta experiência (no caso da igreja tudo pode ser pensado neste aspecto: design, arquitetura, bancos, sistema de som, iluminação, banheiros, estacionamento, serviços de recepção, louvor, calor afetivo dos membros, etc.) e encontrar uma realidade discrepante pode causar uma profunda impressão negativa e logo uma associação (ou  condicionamento) negativo para a marca Igreja Adventista.

O que uma boa experiência, pensando em uma pessoa que passa a frequentar um templo adventista para conhecer melhor a denominação, vai resultar em termos de impactos na vida dessa pessoa?

A experiência é uma porta de entrada, uma forma de comunicação, linguagem e conexão, para abertura de uma mensagem ou cognição mais elaborada. Vivemos em um mundo onde restaurantes, lojas, lugares de recreação estão focados na melhor experiência do cliente. Entendemos que hoje estes ambientes têm de pensar muito mais nas nossas emoções do que propriamente no material que estão entregando.

Este contexto molda nossa mente e passamos a enxergar as relações institucionais e pessoais sobre a mesma ótica. É possível entender, a partir disso, que, se não proporcionamos uma ambiente de riqueza experiencial, estamos abrindo mão de construir uma linguagem e comunicação que pessoas possam entender, gostar e buscar por mais vezes.

A ideia de economia da experiência traz consigo uma forte ênfase no uso de todos os sentidos humanos para se obter o melhor tipo de relacionamento com a marca. Como podemos torna isso uma realidade para as igrejas?

A experiência pode ser criada por duas formas: a primeira por meio de estimulações sensoriais. Aqui vemos a oportunidade de criarmos nos templos um ambiente propício para a relação com Deus e com o próximo. Todo o cuidado é necessário para tal. Nossos sentidos são a porta de entrada de informações conscientes e inconscientes, portanto o design e arquitetura proporcionam sensações para nossa visão; os bancos em relação ao nosso tato, a qualidade sonora aos nossos ouvidos, as fragrâncias ao nosso olfato e os lanches, almoços, e aperitivos servidos nos serviços de algumas igrejas e pequenos grupos estarão afetando nosso paladar. Parece surreal esta avaliação, mas, ao entender os princípios da criação de sensações, nós podemos alterar o ambiente que estamos criando para nossas relações espirituais.

A segunda forma de criar experiência é por meio de histórias. E aqui entra o papel preponderante de vídeos, sermões, lições de escola sabatina, e qualquer material que é utilizado no contato direto entre a igreja e o público. O poder do storytelling é o poder de nos levar a experienciar situações, universos e realidade que não são palpáveis, mas estão presentes em nossa mente. Se entendermos isso, teremos muito mais cuidado no desenvolvimento de vídeos, no preparo de sermões e de pessoas que exercem o papel de professores de escola sabatina.

Do ponto de vista organizacional, passaremos a entender as enormes vantagens de nos utilizarmos de estruturas de narrativa envolvendo dramaturgia ou mesmo literatura.  Entenderemos o papel da arte como promotora das experiências que podem mudar nossa mente. [Equipe ASN, Felipe Lemos]