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Coluna | Diego Barreto

A ditadura da felicidade

A felicidade que somente Deus pode conceder é única e consiste não naquilo que nós queremos para nós mesmos, mas no que Ele quer


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O que é preciso para ser feliz? (Foto: Shutterstock)

O ser humano está em uma realidade limitada. Ele mesmo é limitado em si. Não podemos, nem que quiséssemos, realizar tudo. Portanto, sonhar que somos ilimitados é a ilusão que nos escraviza. Nem ter todo o dinheiro do mundo, nem visitar todos os lugares do mundo, nem ter toda a fama possível e nem o amor de todos é uma realidade ilimitada possível. Mesmo assim, vivemos achando que as conquistas nunca terão fim. É o "correr atrás da cenoura" que nós mesmos colocamos à frente dos olhos, ou o famoso “correr atrás do vento”.

O que eu quero dizer é que, não importa qual seja o seu sonho, ele toma características ilusórias que, obviamente, não são reais. Um empreendedor pode sonhar em ser o dono de uma grande corporação um dia, mas quando chegar lá, vai sentir o prazer indescritível dessa conquista e, logo em seguida, perceber que terminou a missão. O sonho acabou. Não pense romanticamente: “ele só está começando”, porque o fato é que todo desejo saciado é o fim do desejo. Ter o que se sonha é o fim de um projeto. É claro que traz suas gratificações, mas no dia seguinte, levantar da cama para quê?

Algum incauto dirá: “para prosseguir para a próxima meta”. É nessa hora que você vai perceber que as metas são o destino final de um sonho/desejo limitado, finito, que acaba. Então, conquistar um alvo e partir para outro nada mais é do que uma busca circular, um correr atrás do vento, perseguir o próprio rabo. É buscar uma gratificação pessoal que chamamos de felicidade, que dura muito menos que o processo da busca e que logo pede por substituição. Ficar preso dentro de um ciclo é a pior prisão que há, porque ciclos não oferecem alternativas, apenas repetição. Como a vida do homem tem fim, essa será uma repetição até o fim de sua vida patética (por mais incrível que possa ter parecido).

Usando ainda o exemplo do capital, é por isso que bilionários têm a tendência de questionar a própria vida quando alcançam esse patamar. É por isso que, cada vez mais, se lançam produtos exclusivos com características absurdas e preços nababescos. Coisas que não fazem o menor sentido para quem ainda não chegou nesse patamar. Estou falando de carros muito caros, pintados a ouro, de relógios que custam o preço de casas e hotéis com diárias maiores que o valor da prestação de uma mansão. Coisas que valem muito por motivos subjetivos, mas que são utilizadas para motivar alguém que tem tudo a ter algo mais: algo único. Afinal, o que vem depois que conseguimos o que queríamos?

Agora, saia do exemplo do capital e vá para qualquer outra coisa que seja o seu sonho. Visitar todos os lugares do mundo? Há um número limitado de continentes, de países e de lugares, e se você dedicar sua vida a isso, vai perceber, em algum momento, que estará repetindo lugares e voltando a antigas viagens na falta de lugares novos, pela simples razão de que o mundo não é ilimitado.

Quer que todos gostem de você? Ou quer ter fama? Os Beatles chegaram lá e se perguntaram: “E agora? O que faremos?”.

Alegria sem fim?

A ilusão está em achar que a alegria nunca terá fim, uma vez que tenhamos conquistado o que desejamos, ou mesmo em achar que há incontáveis oportunidades de ser feliz nas conquistas da vida. Mas a verdade é que, ao chegar lá, tudo se esvai e precisamos de um novo alvo. Pense na sua vida, nas grandes coisas com as quais sonhou e conseguiu alcançar. No momento em que você chegou lá, em pouquíssimo tempo já estava na busca de um novo alvo para a vida. Alguns entram em crise nesse ponto e não conseguem lidar com a serenidade do fim da busca.

Em momentos como a transição de um ano para outro, as pessoas se propõem a rever suas metas, fazer um balanço e adicionar novos alvos para o ano que está chegando. Vivemos de renovar essa ilusão esticando “cenouras de motivação” à nossa frente. Nos submetendo mais um ano à ditadura da felicidade. Uma demanda comum que infecta a maior parte da sociedade. "Preciso me tornar feliz!" Uma pena que ainda não entendemos que felicidade e ditadura não podem exigir. A demanda atual pela felicidade é um paradoxo, porque a felicidade não pode atender a uma demanda tão opressora. A verdade é que o ser humano é o seu próprio opressor. Em nossa busca pelo infinito, limitados como somos, exaurimos nossos recursos procurando achar o que é impossível de encontrarmos em nós mesmos.

O problema dessa busca incessante é que ela sempre será uma fonte de frustração, visto que nossa vontade sempre vai desejar mais do que o homem é capaz de conseguir. Nunca paramos de trabalhar, nunca paramos de comprar, nunca paramos de correr para lá e para cá, porque todos queremos conquistar nossos sonhos de felicidade. É por isso que alguns ganham tão pouco e trabalham tanto, é por isso que alguns fazem os outros trabalhar tanto e ganhar tão pouco. É por isso que alguns ganham muito, mas não acham suficiente. É por isso que o mundo não para e a cidade não desliga. É por isso que o trânsito está sempre cheio, as filas são grandes e os preços são caros. Porque estamos todos oprimidos na ditadura do “EU preciso ser feliz”.

Deus, que é Infinito e pode todas as coisas, nos ensina um caminho bem mais simples, bem menos ansioso e, por incrível que pareça, bem mais realista (embora possa parecer uma ilusão para os que não O conhecem ou não tem fé). “Buscai primeiro o reino de Deus e a Sua justiça, e todas estas [outras] coisas vos serão acrescentadas” (Mateus 6:33).

O que Deus propõe para mim e para você hoje é: “Cuida das coisas infinitas, aquelas que estão no Meu Reino, aquelas que nunca passarão, aquelas que dão verdadeiro sentido à sua vida limitada, alavancado-a para um novo patamar. Cuida das coisas do Meu Reino: amor, paz, justiça e alegria. O que faltar eu te acrescento. Cuida do que é Meu e eu cuidarei do que é teu. Assim, você não ficará preso no ciclo egoísta da vida finita. Cuide dos interesses do teu próximo, como eu peço, e eu o mesmo cuidarei dos teus interesses. Assim, um ajuda o outro a ser mais; isso evita que cada um corra atrás somente do que é seu. Vem comigo em outra direção”.

A proposta de Deus não traz ditadura, não consome nossa liberdade de maneira fútil. Ela nos liberta de nossas amarras atuais para que possamos fazer o melhor para o outro e nos libertar de nós mesmos. Porque eu mesmo sou um ditador para mim. Eu mesmo me subjugo à escravidão diária. Eu mesmo me oprimo numa busca vã. Deus, salve-me de mim! Liberte-me dos meus próprios interesses e me ensine a viver as metas e alvos de um outro Rei.

Um dia diferente e abençoado, no Reino de Deus, para você!

Diego Barreto

Diego Barreto

O Reino

Vivendo já o Reino de Deus enquanto Ele ainda não voltou. Um olhar cristão sobre o mundo contemporâneo.

Teólogo, é co-autor do BibleCast, um podcast sobre teologia para jovens, e produtor de aplicativos cristãos para dispositivos móveis. Atualmente é pastor nos Estados Unidos.